Longe vão os duelos titânicos, de mais de três horas, que nos deixavam pregados ao sofá, com a fumaça dos cigarros a poluir os estúdios, os cinzeiros, em cima das mesas, cheios de beatas. Quer os líderes partidários, quer os jornalistas, eram de outras águas, feitos de outra massa, tinham outra escola. Sentia-se que tinham uma ideia concreta para o País, e batiam-se por ela. Tinham uma agenda patriótica, fosse qual fosse o seu quadrante ideológico.
Era o tempo das ideologias e das vontades de aço. Hoje, é tudo em alumínio e em PVC. Como vão distantes os tempos de Mário Soares, Sá Carneiro, Álvaro Cunhal e Freitas do Amaral. Até as segundas linhas eram de respeito, Salgado Zenha, Amaro da Costa, Sousa Franco e Octávio Pato. Era a época de Joaquim Letria, Joaquim Furtado, José Megre, Maria Elisa, Fernando Balsinha, Adelino Gomes, duros, acutilantes, assertivos.
Cada um diz o que quer dizer, leva a cassete na cabeça e não há meio de se desviar do guião. Por mais que o entrevistador insista, o rumo mantém-se. Por vezes, dá a impressão que os entrevistados ficam sem rede, se, porventura, cederem aos jornalistas. Outras vezes, parece que estão surdos às perguntas mais inconvenientes. Falam para os fiéis que, já convencidos, batem palmas, para os devotos que os seguem, e neles só encontram virtudes. Talvez sabendo de antemão que vêm condenados a ser monótonos, descoloridos e estafados, todas as televisões convergiram na vontade de os fazerem curtos, em menos de meia-hora se apagam, vão-se num sopro, que pouco tem de democrático.
D. Gonçalo, por conta das suas tiradas medievais e dos seus comentários ordinários, foi relegado para o sarcófago, só de lá saindo com a promessa de ficar mudo. Entre a garantia da recusa e a disponibilidade para a participação, mediou pouco tempo, o suficiente, porém, para que todos os partidos condenassem a atitude e as televisões tirassem o tapete à coxa intenção, ameaçando inviabilizar os confrontos. Não é criticável o recuo, mas sim a imprudência da recusa. Antes de anunciar a sua substituição por Nuno Melo, o parceiro ansioso por correr tudo à espadeirada, numa doentia cruzada contra a esquerda, devia ter pensado nas consequências da decisão. Foi imprudente, descuidado, convencido. De um candidato a primeiro-ministro, com sérias possibilidades de o ser, esperava-se outra maturidade. Antes de se comprometer, devia ter pensava bem no que fazer. O repentismo, também na política, paga-se caro.
As televisões que transmitem alguns debates em canais por cabo, esquecendo-se que nem todos os portugueses os têm, estipulam uns 20 minutos para cada um, e depois deixam que os comentários se prolonguem por mais de uma hora. Por estranho critério editorial, entre os políticos e os comentadores, preferem estes últimos. Com o encargo de avaliarem a prestação de cada um dos líderes e apurarem o vencedor. Como se isso influenciasse alguém, ou interessasse a quem continua a gostar de política, apesar de todas as malfeitorias e destratos que lhe têm feito.
Por mim, os debates só terminariam por exaustão dos participantes. Quando acabasse a cassete, eu queria ver o que havia para dizer…