Sou um jovem de 15 anos. Adoro o desporto. De todas as minhas atividades é a que mais gosto. Não vou identificar-me. Creio não ser importante para o que quero dizer, que são coisas em que vou pensando, vivências que vou tendo.
Escrevo por ser mais fácil. Faço-o com orgulho. O meu pai continua a ser para mim a pessoa mais importante. Que admiro. Por isso, esta carta não pretende ser uma compilação de queixas, azedumes, ou outras manifestações e sentimentos pouco próprios de um filho desportista.
Sabem, os jovens têm um sentido de justiça muito agudo. Fazem a sua leitura das coisas, refletem sobre elas. Têm, pois, opiniões. Não sei o valor das minhas, mas mesmo assim quero expô-las.
As questões de que vos vou falar não dirão muito a alguns dos meus amigos atletas. Provavelmente não partilhariam as minhas opiniões. Mas sei que outros jovens pensam como eu. Estou certo de que as vão apreciar.
Não é do treino – o que treinar, como treinar? – que quero falar-vos. Quem sou eu para o fazer? Como pretender ensinar algo que não domino? Não tenho competências para tal.
Quero falar-vos de mim, de alguns de nós e da nossa rotina. Da dificuldade que experimento como pessoa que estuda, pratica desporto e muitas outras atividades. Que vive os problemas do seu tempo. Que tem os seus próprios problemas, dificuldades, sensibilidades, na aprendizagem do mundo.
Felizmente o meu pai não é assim. Não se comporta como os outros que gritam, insultam, humilham! Diz-me sempre para eu ser feliz com a idade que tenho. E que viva. Que não tenha pressa de ser adulto.
Desde os 7 anos que jogo futebol e continua a ter a mesma postura, a mesma serenidade e o discurso que sempre teve. Não me exige nada que eu não possa dar.
Lembro bem o primeiro dia, já lá vão quase 8 anos. Quando pela primeira vez entrei nos balneários e vesti a camisola do nosso clube. Tremendo com a emoção. Parecia mesmo a sério!
Finalmente concretizava o que tanto desejava. Fazer o desporto que gosto e logo no clube da minha terra. Que alegria, que felicidade. Obrigado, pai!
Depois dos jogos, a que assiste – eu bem o vejo, do canto do olho, a bater palmas e a dar um ou outro sinal de apoio para a nossa equipa –, pergunta-me sempre se quero ir já para casa ou lanchar com ele Programa de pai e filho. Nem uma palavra sobre o resultado e sempre várias de demonstração de apoio: “gostei do vosso jogo, da vossa entrega e alegria”.
Quando eles, pai e mãe, me levam ao treino ou ao jogo, deixam-me “entregue” ao clube, aos treinadores. Confiam neles e sabem que eu também gosto muito dos meus treinadores. Naquelas horas sou mais um dos atletas da equipa e sabem que o treinador me guia para uma experiência saudável na prática desportiva. Nem sempre ficam para assistir. Aproveitam o tempo para fazer outras tarefas.
Claro, gosto de ganhar. Como poderia não ser? Mas gosto de aprender. A fazer as coisas bem, para ser melhor. É importante jogar. Estar lá dentro como os outros. Com os amigos e companheiros. Isso sim, não troco pelas vitórias.
Sim, mais do que ser campeão, quero fazer desporto. Integrar uma equipa. Sentir-me parte dela, em todos os momentos.
Gosto de competir, gosto de ganhar, mas não entendo o desporto que se limita só a isto. A esta ideia, estes princípios, estes valores. Ou melhor, à ausência deles.
Pai, ensinaste-me em casa certos valores, atitudes, respeito pelas pessoas e pelo desporto. Mas aqui nos jogos não os revejo em outros pais. Nem em certas práticas e certos grupos pensados para vencer, que parecem entram em contradição com tudo o que aprendi contigo. Disseste-me que todos devem ter oportunidades e ninguém deve ser excluído por falta de capacidades, quantas vezes mal avaliadas; que o esforço e o empenhamento são tão importantes, talvez mais, que a vitória; que mesmo na derrota podemos sentir-nos bem, ter sucesso, desde que façamos o melhor e sintamos que demos tudo o que nos era possível.
Pai, eu sou feliz e vou continuar a jogar, mas já vejo colegas meus a desistirem porque não se sentem bem. Estão cansados e fartos de conflitos. As expetativas elevadas que tinham, e que os pais deles alimentavam, já se esfumaram. Nem acredito que deixam de fazer algo que tanto os apaixonava!
Obrigado por seres o melhor o pai do mundo.
Feliz Dia do Pai.
Vítor Santos
Embaixador da “Ética no Desporto”