Montenegro e a retórica do vazio

Assim, com Montenegro fica a sensatez, seriedade, juízo e com Pedro Nuno Santos a bazófia e o pedantismo.

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  • 18:00 | Sexta-feira, 14 de Junho de 2024
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O antigo ministro da Administração Interna Eduardo Cabrita disse que “o único excitado |é Marcelo | que quer sempre eleições”. Outros há que o consideram o principal factor de instabilidade da política portuguesa.

Tendo conseguido os seus objectivos perante a sua família política de sempre, abalado na sua credibilidade pelo “caso das gémeas brasileiras” que o traz à boca de cena mais ao seu filho, o “dr. Nuno”, com as selfies aparentemente esgotadas, hoje, o presidente da República serve para surgir ao lado ou atrás de Luís Montenegro, a fazer-nos lembrar aquele “emplastro” do futebol que, para aparecer na televisão, se coloca estrategicamente ao lado das “vedetas”.

Vedetas essas muito eloquentes na retórica que usam, abusando da linguagem – como qualquer político que se preza – para, em cabriolas semânticas fazer passar o preto por branco e o vermelho por amarelo. Um arco-íris…

Pela voz do primeiro ministro, Portugal vai de vento em popa, as plurais promessas eleitorais que o guindaram ao poder, em aliança com o CDS e o PPM, estão todas quase cumpridas. Este “quase” como advérbio de modo e de intensidade dá muito jeito.


Os médicos estão quase aquietados, os professores quase pacificados, as forças de segurança quase aplacadas e etc. e tal, por aí fora.

As reuniões com os diversos sindicatos alongam-se indefinidamente. Não pode ser para hoje, mas será para amanhã, é a mensagem que trazem dessas maratonas, agora que a oposição de rua está em banho Maria.

Entretanto, alguns membros mais expeditos deste XXIVº Governo, arremetem impetuosamente contra tudo o que suspeitam ser contrário aos seus desígnios, demitem, exoneram, tratam com insolência, provocam saídas e rupturas. E assim terá que ser porque os candidatos às prebendas, insaciáveis, não param de pressionar e de reclamar a mordomia que acham por graça caber-lhe.

O primeiro-Ministro promete governar sozinho, com os seus 28,83% de votos conquistados contra os 27,98% do PS, a AD (PSD, CDS, PPM) com 80 deputados e o PS com 78. Como diria o outro, “É poucochinho!”. E isto, se não houver convergência, que e de momento, não parece estar muito próxima. E acrescenta sorridente: “Não é arrogância, é pura responsabilidade!”

Só ele poderá parecer confundir por conveniência os dois substantivos, pois arrogância significa altivez, orgulho, soberba, jactância, presunção, vanglória, insolência, superioridade, bazófia, convencimento, empáfia, enfatuamento, imodéstia, pedantismo, pesporrência, sobranceria… enquanto que a responsabilidade é sensatez, seriedade, juízo, cabeça, consciência, critério, reflexão, siso, tento, tino, razão, retidão, discernimento, equilíbrio, dever, obrigação, incumbência, encargo, tarefa, compromisso, atribuição, comprometimento, cargo, cuidado, conta, parte, supervisão, mão, mando.

Mas convenhamos, Montenegro é suficientemente inteligente para não cair nessa esparrela confusa, apenas com esta espécie de “calembour” pretendendo que os outros nele caiam, pelo trocadilho deixando o melhor para si e o pior para os seus opositores.

Assim, com Montenegro fica a sensatez, seriedade, juízo e com Pedro Nuno Santos a bazófia e o pedantismo.

Haverá incautos que acreditem nesta retórica e, citando Heidegger, … “a linguagem pode descer ao nível de um simples meio de pressão…”, ou parafraseando Barthes, “não tem nenhum valor de comunicação, mas apenas de intimidação”, isto é, o vazio da retórica ou, se preferirem, a retórica do vazio, ponto morto no qual a comunicação se deteve.

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Publicado em Opinião