Li, com a devida atenção, os relatórios disponíveis de Acompanhamento Trimestral: Implementação das Medidas de Apoio ao Cuidador Informal. Documentos bem estruturados – Enquadramento, Requisitos dos Cuidadores Informais e das Pessoas Cuidadas, Projetos-piloto, Grupos-alvo, Entidades envolvidas, Monitorização (indicadores de gestão do processo de reconhecimento do ECI / Ponto da situação das medidas de apoio), Operacionalização, Constrangimentos, Ações futuras, Temas para análise e debate futuro no âmbito da comissão, Legislação aplicável, Glossário, Quadro resumo dos indicadores, Índice de gráficos, Índice de quadros – e importantes para que se faça, regularmente, um ponto da situação e da evolução da sua implementação.
A Comissão de Acompanhamento, Monitorização e Avaliação Intersetorial, Despacho 10045/2020 de 19 de outubro dos Ministros do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social e da Saúde, é constituída por 18 pessoas, de reconhecido valor, nas mais diversas áreas de ação. Legislação, regulamentação, comissão de acompanhamento são instrumentos importantes, mas insuficientes.
Da legislação à efetiva e eficiente execução das medidas há um sem número de barreiras e de dificuldades burocráticas que tornam o reconhecimento de Estatuto de Cuidador Informal (ECI) um processo kafkiano.
Talvez este facto, entre outros, ajude a explicar o reduzido número de pessoas com estatuto reconhecido – 1956 – e de requerimentos oficializados – 6404, se consideramos o universo em questão, em Portugal haverá 1,4 milhões de cuidadores informais. Este número de cuidadores terá sido impulsionado durante a pandemia por causa do fecho de respostas sociais, revelou um inquérito nacional da responsabilidade do Movimento Cuidar dos Cuidadores Informais.
O Presidente da República visitou, no dia 03/04/2021, a residência de um casal cujo marido é cuidador informal da companheira com demência, em Lisboa, assinalando um ano do lançamento de um projecto-piloto de apoios sociais a estas situações. O cuidador informal continua sem apoio e Marcelo fez aviso ao Governo: “A lei foi um começo, agora é preciso pô-la em prática. É preciso alargar [os apoios] a todo o país. Isto toca muitas, muitas famílias.”
A habitual dificuldade de diálogo entre ministérios ficou, uma vez mais, bem visível na morosidade da concretização do protocolo de colaboração entre o Ministério da Saúde e da Solidariedade Social. Consequentemente, o plano de intervenção tardou a concretizar-se. Processo muito burocrático, exigência de muita documentação prévia à entrega do requerimento, falta de formação, canais informativos insuficientes, parca supervisão, são algumas das causas que justificarão os números incrivelmente baixos de requerimentos e de deferimentos de ECI.
Deixo duas sugestões, já o fiz de viva voz a uma responsável do Conselho Diretivo da Segurança Social, aquando do Encontro Nacional de Cuidadores Informais, em 2020, na Fundação Calouste Gulbenkian:
1 – Articulem com as instituições que, todos os dias, no terreno, apoiam as pessoas cuidadas e os seus cuidadores. Poderão ter nestas organizações poderosos apoios na informação, sensibilização, formação e capacitação.
2 – Forme as equipas dos Contratos Locais de Desenvolvimento Social 4G, com presença em boa parte do território nacional, de modo a que possam ser veículos de transmissão da informação relevante do ECI e darem o apoio necessário no preenchimento dos requerimentos. Estou certo que contarão com o incondicional apoio destes profissionais.
Há muitas soluções, se o objetivo de atribuir o ECI, a quem dele precisa e reúna os critérios necessários, for genuíno. Estamos todos cansados de muita legislação e pouca ação. Não nos atirem mais areia para os olhos. Vivemos tempos difíceis, as condições de vida dos cuidadores tendem a agravar-se e não são compatíveis com a acumulação de documentação e legislação em contraste com a lenta e lamentável execução das medidas dos apoio legisladas.