Segundo o evangelho, começou numa quinta-feira a paixão de Cristo, o martírio que o levaria à crucificação e à morte. Neste contexto a paixão tem um significado associado, a uma dor extrema tanto de Cristo, como de todos os que o amavam e que impotentes assistiram ao seu sofrimento.
Deveria falar-se da paixão de Maria, a mãe que nada pode fazer para salvar o seu amado filho! Talvez relacionado com este momento da vida de Cristo, muitas vezes associa-se a paixão ao sofrimento e não raras vezes ouvimos expressões como: “tenho o coração tão negro, com uma paixão tão grande que não sei o que ele me adivinha”, “a Maria traz com ela uma paixão que a vai matar”, “depois que o filho morreu ela anda muito apaixonada”. Esta paixão é roxa…
A maior surpresa relativamente a esta temática da paixão surgiu quando li o livro: Uma Mochila Para o Universo de Elsa Punset. Para responder à questão: É verdade que a paixão se parece com uma doença compulsiva? A resposta dada é a seguinte: A mim, logo à partida, a simples ideia de estar apaixonada, como no primeiro dia, cansa-me. Dão-me razão os estudos mais rigorosos que afirmam que a paixão é uma desordem obsessivo-compulsiva, que em tudo se assemelha, através da química e da sintomatologia. Tenho a impressão que a única razão porque não incluíram a paixão na categoria de doença comum foi por não poderem internar-nos a todos. É aqui que entronca um segundo livro: A Natureza do Amor, de Donatella Marazziti, psiquiatra na Clínica Psichiatrica dell’Università di Pisa. O livro tem por base a experiência de mais de 20 anos da autora com portadores de transtornos mentais cujos efeitos se reflectem na parte psíquica, social e afectiva ao ponto de estes doentes perderem a capacidade de amar. Os estudos levados a efeito por esta cientista e colaboradores comparam os sintomas da paixão com a doença psiquiátrica denominada desordem obsessiva compulsiva, concluindo que nas duas situações os mecanismos bioquímicos que se desenvolvem no organismo são idênticos. Assim foi comprovado que a serotonina – neurotransmissor que actua como sedativo no cérebro apresenta níveis significativamente baixos na fase mais intensa do enamoramento, o que explicaria as reacções ansiosas e por vezes agressivas do apaixonado, que são equivalentes, em termos bioquímicos, a de pacientes que apresentam a doença obsessiva compulsiva. Também compararam os valores de oxitocina, apelidada da molécula do amor e de dopamina, o neurotransmissor da alegria e da felicidade.
Concluíram que a concentração destas substâncias é semelhantes nos dois grupos. Este cocktail hormonal provoca nos apaixonados sintomas que podem ser confundidos com uma doença como: o aumento da pressão arterial, da frequência respiratória e dos batimentos cardíacos, a dilatação das pupilas, os tremores e o rubor, além de falta de apetite, concentração, memória e sono.
Abençoada doença que dá razão a Marcel Proust quando afirma: Para tornar a realidade suportável, todos temos de cultivar em nós certas pequenas loucuras.