A tralha

Se já não simpatizava com o homem - achei-o sempre tosco, mal encavado, grosseiro, sem maneiras e abrutalhado - o cumprimento nazi enojou-me. Há limites para tudo e a memória não prescreve. A democracia, em nome da tolerância, não pode, não deve pactuar com comportamentos que a aviltam e que, a breve trecho, a conduzirão ao patíbulo.

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  • 20:19 | Segunda-feira, 10 de Fevereiro de 2025
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O homem endoudou de vez. Julgava eu que após a baixa médica estivesse um farrapo, um trapo de limpar o pó, mas enganei-me, ele aí está, presunçoso e pedante, à boleia da temperança lusitana que tudo atura e aceita, num sossego que mete dó. E mostra-se velhaco, numa animosidade incompreensível, não economizando na estupidez que sobra da jaqueta apertada, inconvenientes que lhe chegam das esterqueiras clandestinas.

Não contente com o rapinanço miserável a que se dedicou, utilizando respeitáveis espaços públicos como acoito dos seus crimes e armazém dos produtos desviados, o senhor Arruda deu-lhe agora para a excentricidade indecente e sabuja. Replica nos actos reprováveis o destrato que acompanha a sua nada cuidada aparência.

Sacudido por todos, atirado para a última fila do hemiciclo, onde sem vergonha assenta as nádegas e lambe as feridas de um comportamento indigno, encontrou na divergência tacanha a melhor forma de se fazer notado.


Com o aspecto desalinhado e parolo que se lhe conhece, não votou favoravelmente o voto de pesar pelo falecimento de Maria Teresa Horta. Acredito piamente que o sr. Miguel não imagine sequer quem foi a escritora e ainda menos conheça os seus dotes literários e a importância que teve na luta pelos direitos das mulheres e na construção das manhãs de Abril.

Decididamente, a literatura e as artes não serão flores do seu jardim, nem matéria que ocupe os seus neurónios mais virados para marginalidades e interditos.

Votou contra só porque sim, por birra ou amuo, talvez porque algum bonecreiro lhe tenha soprado aos ouvidos, a querer ser bandeira de uma cousa sem nexo.

A par da indigência cultural, que exibe e ostenta, repugnou-me o gesto que acompanhou o seu sentido de voto. A saudação nazi que ele, atabalhoadamente e sem razão, quis dividir com outros colegas, em situações análogas.

Açoitado até pelos conterrâneos, sempre pensei que a triste figura se retirasse do parlamento, emigrasse para os Estados Unidos, e refizesse a sua vida no que dizem ser o país das oportunidades. Nunca supus que tivesse o atrevimento e a desfaçatez de regressar, com modos de quem não aconteceu nada, de quem não foi nada com ele, é tudo uma cabala, obra da Inteligência Artificial.

Se já não simpatizava com o homem – achei-o sempre tosco, mal encavado, grosseiro, sem maneiras e abrutalhado – o cumprimento nazi enojou-me. Há limites para tudo e a memória não prescreve. A democracia, em nome da tolerância, não pode, não deve pactuar com comportamentos que a aviltam e que, a breve trecho, a conduzirão ao patíbulo.

Os regimes democráticos não podem ser brandos para com os lobos que vestem a pele de cordeiros, para com quem se aproveita da sua benevolência, nem para com aqueles que espreitam a oportunidade para imporem uma nova ordem, respaldada no desfazer dos direitos humanos e da cidadania.

Os Arrudas deste país, pela ideologia que escondem, defensores do autoritarismo, do varapau e do cassetete, não deveriam caber no edifício da democracia.

Continuo a acreditar, e cada vez mais, que quem os seus inimigos poupa às mãos lhe morre. E estes apaniguados nazis são inimigos da democracia – não são outra coisa, chamar-lhes adversários é eufemismo – empenhados em tudo fazer para que ela sucumba, à custa também, diga-se, em abono da verdade, dos seus excessos e abusos.

Que os sumos sacerdotes nos livrem da tralha que invocando o nome da família em vão se distrai com oralidades leitosas.

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Publicado em Opinião