Nem mesmo os açorianos se recordam das suas ilhas antes de 1996. Eram terras cinzentas, marcadas por uma visão estreita, limitadas pela mesquinhez que a religião católica impunha sobremaneira.
A liderança política era salazarenta, autoritária, negacionista da abertura a nova ideias que da Europa chegavam e do mundo implicavam as novas gerações.
Os Açores que foram sítio de aportagem de revoltosos e centro de revoluções, que foram fraga de nascimento de vultos que fizeram o país da política e das letras, que deram vagas de emigrantes que se afirmaram trabalho e riqueza no outro lado do Atlântico, estavam a ficar para trás, esquecidos.
Talvez o primeiro ocupante do Palácio de Sant’Ana tivesse pressentido, nesses anos de final da década de 1980, que o seu tempo já não era o do porvir e assim começou a mudança.
1996 foi mesmo o ano da liberdade.
Montar uma rede de saúde em tantas ilhas e fazê-la articular com o continente não terá sido coisa fácil; consolidar e desenvolver um sistema de educação, que não esquece nenhum dos que ali vivem, deve ter sido, deve continuar a ser, uma tarefa ciclópica. E nunca é demais lembrar que em 1996 que a região tinha uma escolaridade básica que se ficava no 9º ano, não existia pré-escolar público, nunca ninguém tinha tido qualquer apoio à sua situação de pobreza para além de uma esmola que era o abono de família.
De 2012 até 2020, com a mudança de liderança regional, os Açores continuaram a navegar em águas calmas. Talvez tenham sido calmas em demasia e, por isso, não preveniram a chegada de uma pequena tempestade que, passados três anos, se transformou num quase soçobro.
Os poderes são assim. Carlos César foi, até hoje, a marca que fez a autonomia. Não porque tenha sido o primeiro, mas porque foi o maior.
O Partido Socialista foi o grande partido regional durante a maior parte do tempo em que a região viveu em democracia. No governo regional, nas autarquias locais, em algumas das mais importantes instituições, os socialistas fizeram-se elite e construíram uma forma de estar que deixou marcas. Mas como em tudo, importava uma profunda renovação a partir do território e não só a partir do poder. Importava um Novo Futuro.
Ambos respiram açorianismo, ambos se sufragam no pedigree republicano que por aquelas ilhas é essencial. Ambos são intuitivos e inteligentes, obstinados e duros, ambos são bem relacionados e ponderados.
Francisco César vai iniciar a sua caminhada para ganhar os Açores. No caminho irá vendo o que importa fazer para o conseguir, mas não deixará de ser ele a construir e a liderar o novo futuro de esperança.
Para isso, nada há a fazer que não seja sentir o muito orgulho por seu pai e pelo que este fez pelos Açores. Para isso nada mais há do que assumir a utopia de sempre e que se chama – Açores.
Ascenso Simões