Segundo a Direcção-Geral do Património Cultural, a Cava do Viriato é um património “classificado como Monumento Nacional” por Decreto de 16-06-1910, DG, n.º 136, de 23-06-1910 , sendo ZEP por Portaria de 3-02-1970, publicada no DG, II Série, n.º 48, de 26-02-1970 (sem restrições) e com a seguinte nota “histórico-artística”:
“Tradicionalmente atribuído a um tão glorioso quanto lendário período de resistência lusitana à conquista romana, e depois aos próprios romanos, só muito recentemente estas catalogações foram postas em causa para o monumento conhecido como “Cava de Viriato”. No estado actual dos nossos conhecimentos, pode mesmo dizer-se que ele ilustra bem a tradição historiográfica nacional, tão alicerçada em atribuições duvidosas (sistematicamente repetidas), antes que existam esforços científicos de comprovação ou rejeição. Neste caso, apesar das múltiplas reafirmações acerca da sua pretensa antiguidade, nunca houve uma intervenção arqueológica, limitando-se os trabalhos a campanhas de prospecção que lograram identificar algum material que, para além de descontextualizado, se assume como de pouca relevância. Nos últimos anos, todavia, o grande impulso dado à arqueologia medieval islâmica permitiu o aparecimento de uma perspectiva alternativa, que confere ao período muçulmano a construção deste complexo sistema militar. As primeiras dúvidas foram avançadas por Vasco Mantas, que estranhou a inexistência de qualquer paralelo planimétrico romano (MANTAS, 1996; 1998; 2002 e 2003). Mais recentemente, Helena Catarino teve oportunidade de confirmar algumas conclusões daquele autor e salientar outras que colocam a Cava em plena época islâmica (CATARINO, 2005). Ambos coincidem na funcionalidade tradicional apontada: a de se tratar de uma fortaleza. Ocupando uma área de cerca de 30 hectares, a fortificação é um imenso octógono, “com muros de terra rodeados por um fosso, cujo diâmetro interior é de 640 metros”, tendo os muros uma largura, na base, da ordem dos 30 a 35 metros (MANTAS, 2003, p.40). Uma tal configuração, que não encontra qualquer semelhança a nível peninsular, parece ter melhor explicação nas “cidades-acampamentos” muçulmanas, de que o melhor exemplo conservado é a de Samarrã, no actual Iraque, local já intervencionado arqueologicamente e sede do poder califal abássida entre 836 e 892 (CATARINO, 2005, p.202). Hoje, tal como a podemos ver, a Cava foi sujeita a algumas modificações e muitas destruições, mas o perímetro é ainda integralmente reconhecível. Ao que tudo indica, ela possuía um relativamente complexo sistema de engenharia hidráulica, na medida em que o seu interior e os fossos em redor estavam ligados ao rio Pavia e à ribeira de Santiago e dentro do recinto existiam diversos poços e cisternas de armazenamento de água (IDEM, pp.201-202). Se, na actualidade, a perspectiva islâmica se impôs sobre a tradicional catalogação romana, são muitas as dúvidas que se mantêm. Uma das mais importantes relaciona-se com a cronologia exacta a atribuir ao monumento. Helena Catarino (IDEM, p.202) sugere tratar-se de uma “uma qal’a, ou cidade acampamento, do mesmo tipo dos outros qila’ que as fontes árabes indicam para a primeira época islâmica”, mas não exclui outras hipóteses posteriores, nomeadamente durante o poder emiral e, sobretudo, na época de Almansor (Al-Mansur), altura em que Viseu foi o ponto de partida para uma série de razias destrutivas no Norte asturiano-leonês. De maior complexidade é a hipótese avançada por Vasco Mantas a respeito de um primeiro estabelecimento romano, eventualmente do século I a.C., que o autor sugere reconhecer no interior do grande octógono. Aí existe uma “pequena plataforma natural”, de desenho rectangular, onde parecem confluir quatro vias, provenientes dos diversos pontos cardeais (MANTAS, 2003, p.42). Esta perspectiva viria, assim, explicar algum material romano aqui aparecido, embora este não possa ser considerado como um vector fundamental de interpretação. Com estas recentes propostas cronológico-funcionais estão reunidas todas as condições para que se avance com uma investigação arqueológica de grande escala (a que é determinada pela monumentalidade da estrutura) e de forma sistemática, que permita responder a muitas das dúvidas acerca desta enigmática fortificação.” PAF
Muito bem, contextualizado o espaço, a pergunta é:
O que anda a Senhora Câmara (?) a fazer com um aterro do lado esquerdo da Rua do Coval / Rua dos Plátanos para a antiga Estrada de Santiago, nas traseiras dos Viveiros da Cava?
É de realçar que este troço da Cava é mais baixo do que os outros;
Que a actual base exterior coincide com a cota em que assentam as pedras que suportam o aterro, sobre o qual parece estar montado um depósito (?) de madeira;
Será possível que se configure, aqui, uma anulação do talude, em vários metros no trecho que vai da Rua dos Plátanos à Estrada Velha de Santiago?
Há 7 ou 8 decénios foi anulado a parte do talude da Cava que corresponde à actual localização da Casa das Águias e quinta anexa. E agora?
Alguém nos explica o que aqui se está a passar?
A DGPC está a par destas obras/alterações? Autorizou-as?
E que diz o IGESPAR sobre o assunto?
Naturalmente ninguém está a cometer um atentado patrimonial e tudo terá uma explicação natural e plausível.
Vamos esperar para ver e melhor perceber o que por aqueles lados se passa.
A vereação cultural da edilidade deve ter uma palavra a dizer, pois nem sequer no mais aziago dia ousaríamos pensar que não está a par da ocorrência; que a ocorrência possa ser ilegal; que o património artístico-cultural português não está a ser devidamente protegido e/ou acautelado pela Câmara Municipal de Viseu, tão ciosa e empenhada em tornar a nossa urbe Património da Humanidade.