“EU FUI À TERRA DOS “FÁLGAROS”
Fica nas abas das “Terras do Demo” a quem desce desse gigantesco plaino da Lapa que se estende a Ocidente até emparceirar com o gigantismo do planalto gémeo da Nave e já não fica longe da amenidade da Ribeira do Távora cujo influxo se apercebe no viço dos linhares cultivados, nos renques de fruteiras, no […]
Fica nas abas das “Terras do Demo” a quem desce desse gigantesco plaino da Lapa que se estende a Ocidente até emparceirar com o gigantismo do planalto gémeo da Nave e já não fica longe da amenidade da Ribeira do Távora cujo influxo se apercebe no viço dos linhares cultivados, nos renques de fruteiras, no descompassado tilintar das campainhas de duas vacas pastando.
Acabo de chegar da terra dos “fálgaros”, que assim designa a gente um antigo manjar conventual, estranho na forma e na cor de cogumelo maduro, esquisito de nome e de sabor, enigmático, mais de baptismo do que de origem já que berço tiveram na cozinha do Mosteiro, não sabemos, ou na roda dos enjeitados onde a madre-rodeira os recebeu.
Guarda o nome “Tabosa” esta imaginal “terra dos fálgaros”, aldeiazinha colada ao Carregal, no Concelho de Sernancelhe, à qual sobreleva com o aparato do seu Mosteiro que deixei ao fim da tarde de hoje envolto no seu misticismo e nessa calada desgraça do abandono de mais de um século de que escapou a igreja que resistiu no sublime aparato da sua pedraria.
Agora há-de contar-se sempre, me disseram, que os fálgaros tiveram berço nesse Mosteiro que um dia foi rico e depois empobreceu por causa de um iníquo decreto de um rei que dali levou as monjas, as rendas delas, sem que lhas tivessem devolvido no regresso. E talvez por isso tivessem inventado este manjar de humildade tamanha – farinha de trigo moída antigamente nos moinhos da vizinhança, queijo das vacas que também lavravam terra, às vezes misturando o leite de vaca com o leite de cabra e ovos das muitas galinhas de criação. E apenas o cansaço dos braços a amassar, gestos sem conto e o forno quente como se fosse de cozer pão, indo e vindo a pá da forneira e depois, como que florido, jardim de magia, esse pão de Deus que o é também, cesto de verga ou tabuleiro, passos de mulher esquecendo o suor do rosto da colheita do pão.
E a alegre mesa de Páscoa! E a prenda de amigos! E as festas que se inventam!… E já ninguém se lembra das monjas do Mosteiro!…