Uma equipa de investigadores da Universidade de Coimbra (UC) lidera um projeto que visa desenvolver produtos inovadores a partir do sargaço, denominação dada na costa litoral norte à mistura de diferentes algas que crescem nas plataformas rochosas e são desprendidas dos rochedos com o movimento das ondas, depositando-se na beira-mar.
Em particular, o projeto “ValSar: Valorização do Sargaço da Costa Litoral Norte”, financiado por fundos europeus (FEAMP) através do MAR2020 – GAL Costeiro Litoral Norte, propõe desenvolver novos biofertilizantes e bioestimulantes (produto natural orgânico, geralmente pobre em nutrientes, mas rico em compostos bioativos que estimulam processos naturais de uma cultura, como, por exemplo, a absorção de nutrientes, entre outros) para aplicação na agricultura, bem como avaliar a potencial aplicação de compostos bioativos do sargaço no setor farmacêutico e de cosmética.
«A apanha do sargaço foi uma atividade económica muito relevante no passado, sobretudo na agricultura, mas atualmente é uma prática quase extinta no litoral norte, entre Viana do Castelo, Póvoa do Varzim e Vila do Conde, zona do país onde a apanha do sargaço era mais comum. Queremos valorizar este conjunto de algas que abundam na nossa plataforma continental e que estão subaproveitadas. O sargaço é uma mistura orgânica muito rica, quer em termos de compostos minerais quer em termos de compostos bioquímicos», contextualiza Cristina Rocha, investigadora do Centro de Ciências do Mar e do Ambiente (MARE) da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC) e coordenadora do projeto.
Para alcançar os objetivos do projeto, a equipa começou por caracterizar sazonalmente a diversidade, quantidade e composição química e bioquímica da mistura de algas. Esta caracterização, explica Cristina Rocha, «permite identificar os diferentes compostos bioativos do sargaço e selecionar os mais promissores para os produtos que pretendemos desenvolver, isto é, para a valorização que propomos».
Com base nesta informação, os investigadores vão agora avançar para a preparação dos extratos. Para o setor agrícola, o projeto aposta no desenvolvimento de um substrato corretivo fertilizante, misturando o sargaço com «resíduos sólidos urbanos para tentar obter um composto mais rico, que potencie melhor o crescimento das culturas, pois estas algas possuem muitos compostos minerais, alguns deles, por exemplo, o iodo, que não conseguimos ter num composto só à base de biorresíduos. Vamos também desenvolver bioestimulantes», conta a investigadora do MARE-FCTUC.
Estes fertilizantes e bioestimulantes vão depois ser testados num conjunto de culturas de interesse económico para a região Litoral Norte, tais como culturas de couve, alface, feijão e pimento.
Em paralelo, a equipa vai explorar a outra linha de produtos dirigida ao setor farmacêutico e de cosmética. Sabendo-se que as algas possuem muitos compostos bioativos, «com diferentes atividades biológicas, como, por exemplo, antivirais, antibacterianas, antifúngicas e antitumorais, nós vamos preparar extratos e testar os compostos bioativos desses extratos em ensaios de exposição de células do sistema imunitário e em linhas celulares que representam a pele – a epiderme e a derme. Através destes ensaios, que vão ser realizados no Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC-UC), vamos poder identificar o potencial dermatológico do sargaço, ou seja, vamos estudar propriedades anti-inflamatórias, antioxidantes, regeneradoras, antienvelhecimento e antialérgicas, entre outras», detalha a líder do projeto.
Iniciado há um ano, o projeto ValSar, conclui Cristina Rocha, apresenta «um elevado interesse coletivo, uma vez que visa promover a valorização de uma atividade económico-social e de um recurso natural da região Litoral Norte, centrando-se na inovação de produtos e biotecnologia e criando condições para o empreendedorismo».