A vergonha da caridade de auto promoção política

Vem isto a propósito de perceber em solidariedade e sentimento o quanto a comunidade brasileira (e as demais em menor número) residente em Viseu sofre ao, de repente num país que não é o deles, se ver forçada a ter que viver com a pandemia que a todos por igual ameaça.

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  • 18:17 | Quarta-feira, 01 de Julho de 2020
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Muitas vezes, achamos erroneamente, que as coisas são brancas ou pretas, isto ou aquilo e ficamos presos numa rede maniqueísta que nos faz ignorar o terceiro lugar.

Isso aplica-se às nossas ideologias políticas, ao clube de futebol, aos nossos relacionamentos afetivos, aos nossos gostos pessoais, crenças religiosas, etc. Nada melhor para quebrar as nossas certezas do que sair da zona de conforto, que é a nossa “ilusão” acerca de verdades absolutas. Uma maneira certeira de vivenciar essa quebra de paradigmas é morar fora do nosso país de origem, é ser estrangeiro.

Os caminhos que levam as pessoas a deixarem o seu país, são muitos e por diferentes motivos e eu já fiz parte de uma minoria. Deixei Portugal por 5 anos e fui com uma enorme bagagem, de vida, família e tralhas para outro país do outro lado do mundo. No começo tudo é novidade, nos encantamos e vivemos quase como turistas. Mais tarde, as coisas entram numa rotina, percebemos algumas falhas no que parecia perfeito e descobrimos, aos poucos, que problemas e dificuldades existem em todos os lugares e também que gente boa e gente má não são um predicado exclusivo dos portugueses. Mas, vamo-nos acomodando, aculturando e estabelecendo as bases de um novo quotidiano. A língua começa a ficar mais confortável, descobrimos novos amigos e começamos a envolver-nos socialmente dentro da nova realidade. Já adaptados, bate a saudade, e começam as perguntas, e se?


E se de repente, houvesse aqui um problema grave? E se houvesse aqui uma calamidade? Como proteger família e bens num mundo que sendo nosso não é em nada nosso? Será mesmo que aqui é tão melhor que em Portugal? Onde estão meus amigos e familiares? É então que percebemos que já não somos de cá, nem de lá e é aí que entra o “terceiro lugar”, habituamo-nos a ser cidadãos do mundo com a certeza de que um dia seremos só memória e saudade. O homem é ele e as suas circunstâncias, já dizia o filósofo!

Vem isto a propósito de perceber em solidariedade e sentimento o quanto a comunidade brasileira (e as demais em menor número) residente em Viseu sofre ao, de repente num país que não é o deles, se ver forçada a ter que viver com a pandemia que a todos por igual ameaça.

Viseu que na última década tem perdido população a um ritmo de 1000 pessoas por ano viu em 2019 quebrada essa fatalidade com um aumento de mais 250 pessoas, o que não sendo muito é um indicador positivo e de esperança. Muitos desses brasileiros que vieram já viram os seus filhos aqui nascer, são viseenses antes de mais, outros já aqui têm os filhos a estudar no ensino superior e, por incrível que pareça já são até donos de muito património e criaram empresas que já alimentam várias famílias de portugueses. Outros, quando de repente ocorreu esta crise pandémica, que é no caso o mesmo que dizer económica, ainda não tinham estabilidade para poder sem grande sobressalto sobreviver à mesma sem ajudas de terceiros, seja de amigos, familiares ou da administração pública.

No dia 06 de Maio no jornal das 20h, o vereador dono disto tudo e marido da directora do Viseu Marca expunha na SIC o caso de duas famílias brasileiras, uma delas recém chegada há menos de um ano e cujo filho já nasceu em Viseu e uma outra apanhada numa situação de desemprego por efeito da pandemia e cujo cabeça de casal veterinário por formação andava agora nos serviços florestais a cortar mato não tendo ainda recebido um único salário. Na reportagem dava-se nota que 1/3 das famílias apoiadas eram brasileiras dando o vereador a entender que por se encontrarem numa situação de fragilidade o que será verdadeiro e ilegalidade o que é só mais uma mentira na narrativa montada para poder ter uma arma política de arremesso à inércia da Segurança Social. Facto é que para um ficar bonito na fotografia por força da necessidade houve duas famílias que foram totalmente devassadas e expostas pelas vicissitudes a que se viram sujeitas.

Toda a propaganda política e cenário montado pelo “voluntário” vereador da acção social por omissão da verdadeira detentora do pelouro, “a da perna curta nas suas palavras”, é uma falácia de meias verdades como o facto de não estarem sinalizados pela Segurança Social uma vez que a lei lhes permite a isenção durante um ano até à pretensa discrição com que essa solidariedade social é praticada. Discrição quando a primeira acção que o evangélico hipócrita tomou foi a de personalizar a ajuda com um logótipo nas viaturas e sacos de papel devidamente marcados para que vizinhos e transeuntes não tivessem dúvida de que chegou o apoio do pai dos pobres? Quanto gastaram nisso que poderia ter sido usado para ajudar mais umas famílias ou reforçar a oferta da ocasião? Que Deus os castigue sim, porque da nossa parte só podem receber repúdio e desprezo.

Não satisfeito com isso o ego gigante do patrão do Rossio ainda obrigou a uma pantomina da vaidade no Fontelo, local abrilhantado pelos pavões, os que ali moram e os que lá se deslocaram, para proferir a ode ao gestor do call center que durante 100 dias atendeu 2737 chamadas ou seja nem 30 chamadas por dia envolvendo voluntários tendo até a representante ali presente assim que foi chamada a pronunciar-se ter logo dito que (sic) “eu não tenho nada a ver com política diga-se de passagem” por certo por se ter apercebido da tramóia e falsidade onde a meteram.  E mais uma vez lá veio a conversa dos brasileiros. Se o vereador estivesse atento ao pior das redes sociais e andasse pelos cafés a escutar o povo perceberia que nesse momento voltou a levantar a xenofobia, a estigmatizar a comunidade, a promover o racismo, o ódio social e a dar corpo à critica miudinha e mesquinha do “andamos nós aqui a pagar impostos para alimentar estes pançudos que recebem o Viseu Ajuda”.

Pior é alimentar os pançudos que no Rossio estoiram orçamento, tempo e o futuro dos viseenses tendo sido eleitos para promover os valores maiores da democracia e da cidadania! Vergonha alheia é o que sinto por gente desta que a troco da sua agenda pessoal esmagam a vida do colectivo de famílias e munícipes!

Sejam imigrantes brasileiros ou outros, portugueses residentes que também os há e até muitos emigrantes inclusive a receber apoio de outros países, e até, imaginem, portugueses a serem apoiados no Brasil, ninguém merece que na desgraça ou nas dificuldades veja a sua vida exposta a público pelos sacrifícios a que se obrigam, ninguém merece que lhe seja prestada caridade em benefício próprio para levar vantagem na promoção pessoal, como em tudo parece ser o caso da política deste executivo em todo esta luta contra o Covid-19.

A caridade se e quando existe tem de ser anónima, senão é vaidade pessoal. Há que fazer o bem sem olhar a quem. Caridosos destes são o estigma do elevado acto de solidariedadae e a vergonha de todos aqueles que não olham a pretextos, sejam eles os mais pérfidos e insidiosos, para promoverem as suas figurinhas.

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