Na luta contra o idadismo, tal como no combate a outros “ismos” (racismo, sexismo, capacitismo…), há lugar para todos e todas. Continuamos a ser poucos para derrubar, como afirma o médico e gerontólogo Alexandre Kalache, o último grande tabu, a discriminação baseada na idade. Vejo com bons olhos que as prestigiadas revistas Vogue – inglesa e americana – dediquem as suas edições de agosto e setembro a mulheres com mais de 50 anos. São quatro ícones da moda, supermodelos, que ilustram as respetivas capas: Naomi Campbell, Cindy Crawford, Linda Evangelista e Christy Turlington. Publicações que servem de antecâmara à aguardada série documental “The Supermodels” que estará disponível, na Apple TV, em setembro.
Não querendo cair no cliché “quem o feio ama, bonito lhe parece”, é certo que as definições de belo e de feio são complexas e mutáveis, ao longo da história da humanidade. Longe vão os tempos em que a gordura era considerada formosura, a gordofobia também deve merecer a nossa atenção.
Estas mulheres, hoje como no passado, não representam a maioria da população feminina, mas podem, cada uma delas, tal como a indústria da moda, contribuir para desconstruir preconceitos e estereótipos. Nos nossos percursos de vida, uma ou outra ruga não afetará um espírito positivo e a afirmação da identidade. A moda tem uma capacidade superlativa de influenciar a sociedade. Esta indústria e a grande visibilidade das suas protagonistas (o mesmo pode ocorrer no cinema, na música, no desporto…) pode ser uma poderosa aliada na desconstrução do idadismo. Outro exemplo recente é protagonizado pela atriz Ángela Molina que, aos 67 anos, é a estrela da nova coleção da Zara “Treze Peças”. A vencedora do Goya de Honra, que se assume contra as intervenções estéticas e é um exemplo de envelhecimento ativo em Espanha, protagoniza, como noticiou a S Moda (El País), a nova campanha do grupo Inditex contra o idadismo, a par da modelo Rianne Van Rompaey. Molina simboliza a força, a independência, a elegância e é um exemplo de quem não tem medo de envelhecer. Temos outros bons exemplos recentes, Martha Stewart (81) notabilizou-se ao tornar-se a modelo mais velha de sempre na Sports Illustrated Swimsuit e a tatuadora filipina Apo Whang-Od foi capa da Vogue Filipinas (106). Contudo, há um longo e difícil trabalho para fazermos, se queremos envelhecer com os nossos direitos intactos, sermos respeitados e mantermos o nosso lugar na sociedade.
O El País deu destaque a esta incitava contra o idadismo e considerou que “A apresentação de Ángela Molina como imagem da Zara é mais uma aposta da gigante têxtil na diversidade em todas as suas formas. Com a escolha de uma senhora de 67 anos como modelo, a empresa galega dá um passo na luta contra o idadismo, ou seja, a discriminação contra os mais velhos com base na idade.” (@elpais).
Quase 94 928 pessoas clicaram em gosto no Instagram do jornal e foram escritos 1967 comentários, uns elogiosos e outros, numa percentagem substancial, bastante críticos. As redes sociais e as caixas de comentários pulverizam qualquer assunto e ativam as mais diversas fações.
O grupo Inditex, como qualquer empresa, visa o lucro e, logicamente, trabalha para o conseguir. Não tenho qualquer objeção a que assim seja, desde que também não se exclua da responsabilidade social. A economia prateada ou da longevidade não deve ser negligenciada e pode ser o motor de um novo olhar para o processo de envelhecimento que não deve ser acantonado na perda, negatividade, dependência, doença, tristeza, solidão, isolamento, fatores potenciadores do idadismo e, no limite, dos maus tratos e da exclusão.
Fiz também o elogio da campanha da marca Adolfo Dominguez “Sê mais velho”, porque acredito que, não sendo a panaceia, são exemplos que contribuem para a difusão da mensagem que importa fazer chegar a todas as pessoas de todas as idades. Ao falar com responsáveis de diversos setores, acerca da importância da intergeracionalidade nas empresas e nas instituições, percebo que, quando se faz o “click”, há uma preocupação genuína em olhar para dentro, com o filtro da inclusão e da diversidade, e procurar perceber se as suas práticas potenciam ou hostilizam a diversidade, entre elas a geracional.
Acredito que estas campanhas poderão ser o tiro de partida para uma “revolução” silenciosa dentro das próprias marcas. Em Espanha (Salamanca, Vigo e Santiago de Compostela) vi várias mulheres, com mais idade, a atender na Zara, Cortefiel, Adolfo Dominguez, Massimo Dutti…
E em Portugal, como será? Vou estar atento a esta realidade e dar-vos-ei mais notícias brevemente.
(Foto DR)