Na última sessão da Assembleia Municipal (AM) de Viseu, no passado dia 6, para além da aprovação das alterações ao PDM, pela maioria do PSD, com votos contra do PS e do BE e oito abstenções, incluindo de alguns presidentes de Junta, sobressaíram dois momentos surpreendentes.
Um deles foi o único voto contra a moção “Promover a Escola Pública e o respeito pelos direitos dos professores”, apresentada pela eleita do Bloco de Esquerda, ter vindo de Lúcia Silva, deputada municipal e também deputada na Assembleia da República na bancada do PS. O facto de esta “bideputada” ser professora levou a que, na manifestação de professores que, no dia seguinte (dia da greve convocada pela FENPROF no distrito de Viseu), encheu o Rossio com mais de mil docentes vindos de todo o distrito, o seu nome, invocado por Mário Nogueira, suscitasse uma estrondosa vaia, com apupos e assobios.
O outro momento lamentável desta sessão da AM foi ouvir o presidente da Câmara, Fernando Ruas, exigir ao governo que faça uma auto-estrada entre Viseu-Coimbra com fundos comunitários, aproveitando alegadas excepções à decisão da Comissão Europeia de não autorizar nem mais um euro para auto-estradas em Portugal, tendo em conta que somos o segundo país europeu com mais auto-estradas relativamente ao número de habitantes, e o quarto com mais quilómetros de auto-estrada, apesar da reduzida dimensão do nosso país.
Acontece que o primeiro governo de Costa, perante o veto de Bruxelas ao financiamento de mais auto-estradas e a oposição das populações ao cerco de Viseu com portagens, optou pela duplicação do IP3 em 85% do seu percurso, ou seja, em perfil de auto-estrada, sem portagens, ficando com três vias (2+1) em 12% do trajecto e apenas duas vias (1+1) em 3% do percurso, para uma ligação segura entre as duas capitais de distrito, Viseu e Coimbra.
Esta solução colheu o apoio da maioria dos autarcas do PS e do PSD das regiões abrangidas, bem como mereceu o acordo da CIM Região de Coimbra e da CIM Viseu Dão Lafões, e das associações empresariais de ambas as regiões, indo ao encontro da petição que reuniu mais de 18 mil assinaturas para levar ao Parlamento a requalificação urgente do IP3, uma iniciativa das associações empresariais da Região de Viseu (AIRV), do Conselho Regional do Centro, da Associação Comercial de Viseu, da Associação Empresarial de Mangualde e da Associação Empresarial de Lafões e mereceu ainda a concordância das Comissões Distritais de Viseu e Coimbra do BE, que numa posição conjunta exigiam apenas o cumprimentos dos prazos previstos para as obras.
Apesar deste amplo consenso, na Assembleia Municipal de Viseu, o PSD e o CDS chumbaram uma moção, apresentada pelo BE, de congratulação pelo projecto de duplicação do IP3 em 85% do percurso, exigindo a sua urgente calendarização.
A Distrital de Viseu do PSD fez coro com o então presidente da Câmara Municipal na defesa da chamada “Via dos Duques”, que o governo PSD/CDS, a poucos meses das eleições legislativas em que perderam maioria parlamentar, anunciou como um projecto de uma auto-estrada, portajada, entre Viseu e Coimbra, financiada exclusivamente por privados. Como denunciei neste jornal, na edição de 21.09.2017, não era verdade que o projecto mal amanhado da chamada Via dos Duques fosse sem custo para o Estado, porquanto o deputado Pedro Alves, do PSD, na sessão da AM de 26.09.2016, disse:
Ora, o deputado do PSD (na AM de Viseu e na Assembleia da República) deixou, aqui, bem claro o que o governo PSD/CDS estava a preparar: entregar ao consórcio privado que ganhasse o concurso de concepção, construção e exploração da nova auto-estrada, de mão beijada, uma estrada em perfil de auto-estrada, já construída e paga pelo erário público, o IC12, entre Canas de Senhorim e Santa Comba Dão, enquanto o IC37 (entre Viseu e Nelas), o troço mais caro de construir, devido à orografia do terreno, que requererá a construção de várias obras de arte (pontes), ficaria a cargo do Estado, isto é, seria pago por nós todos, contribuintes.
Razão tinha o Engº Jorge Paulino Pereira, professor de Vias de Mobilidade Urbana e Transportes, no Instituto Superior Técnico, um dos oradores no debate promovido pela ProViseu sobre Acessibilidades Rodoviárias e Ferroviárias à Região Centro, em Maio de 2017, quando afirmou que as PPP (Parcerias Público-Privadas rodoviárias eram uma fraude, uma forma de arranjar dinheiro para os privados.
Quanto à captação de tráfego, de que falava Pedro Alves, basta recordar como Sérgio Monteiro, quando secretário de Estado do governo de Passos e Portas confessou numa entrevista que se o governo requalificasse o IP3 não haveria nenhum privado interessado em construir a auto-estrada. Ou seja, um governo do PSD comprometer-se-ia perante os privados em não requalificar o IP3 para não haver alternativa livre e segura à auto-estrada portajada e Viseu ficaria uma ilha rodeada por portagens por todos os lados e continuaríamos a correr risco de morte no IP3. Cada vez há mais profissionais a fugir das portagens, como os professores nas deslocações casa-escola, optando por estradas menos seguras.
Agora, resta-nos exigir a rápida execução das obras de requalificação e alargamento do IP3, cujo prazo de conclusão estava previsto para o ano passado. E apostar o dinheiro do PRR na mobilidade do futuro, a ferrovia, por forma a aumentar a competitividade do transporte ferroviário, menos poluente, melhorar as ligações internacionais e aumentar as ligações inter-regionais. Sem esquecer a minha proposta de ligação, por autocarro, da Central de Camionagem de Viseu à Estação de Mangualde da CP, nos horários dos comboios inter-cidades, que já tinha merecido a concordância pública dos autarcas de Viseu e de Mangualde, Almeida Henriques e João Azevedo, enquanto não se concretiza o Corredor Internacional Norte que deverá ligar Aveiro (Linha do Norte) a Mangualde (Linha da Beira Alta), cujas candidaturas aos fundos europeus já foram negados por duas vezes com base na razão custo-benefício.
Mais portagens é que NÃO, obrigado, presidente Ruas!
(Foto Carlos Vieira)