Valência: Mentiras e intoxicação da extrema-direita

Grupos de ultra-direita espanhola, apologistas do franquismo, encontram-se organizados na comarca de Horta-Sud desde o primeiro dia da tragédia, grupos como a Revuelta, que se fazem passar por voluntários, mas mais que não fazem que destruir o poder político e sobretudo, inventar “bulos” (como se chamam no Estado espanhol), ou seja, inventar mentiras. 

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  • 14:01 | Sábado, 09 de Novembro de 2024
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Quem viu, no dia 3 de novembro, o Pedro Sanchez sair apedrejado, a sangrar e visivelmente atordoado, da localidade de Paiporta, a zona zero das cheias em Valencia, e tem a plena noção do que se está a passar na comarca Horta-Sud, sabe que o Pedro Sanchez foi um bode expiatório da direita e da extrema-direita, portuguesa e espanhola. Uma extrema-direita que se encontra bem organizada, desde o primeiro dia, no local das cheias.

Uma ideia alicerçada pelas mentiras e intoxicação alimentada pela imprensa espanhola, que mais não sabe do que fazer, na sua maioria, tábua rasa aos políticos e a política, mas logo depois passam a exigir mais Público e mais meios, públicos.

Foi um erro ir, no dia 3 de novembro, a Paiporta num clima de tensão, alimentado pela extrema-direita e pela imprensa espanhola.


Tendo a noção que o Governo Central tem responsabilidades, por ser Governo Central e por ter sido eleito por todos os residentes do Estado. Sabemos também que se fosse ativar o nível 3 do estado de alarme, o Governo Central teria poderes para intervir e gerir a tragédia que assolou Valencia. Mas também temos que saber que as Comunidades Autónomas têm autonomia e competências para lidar com estas situações e retirar o poder às entidades mais próximas e mais conhecedoras do território seria um erro e um atropelo à autonomia das regiões.

Se o Governo Regional, liderado pelo PP com o apoio do Vox, tivesse feito o trabalho que deveria fazer, não estaríamos agora a apontar o dedo a ninguém.

As Comunidades Autónomas pedem mais autonomia e quando chega a hora da verdade, escondem o problema para debaixo do tapete?

Vejamos que o PP de Valencia, liderado por Carlos Mazón, um dos partidos mais corruptos da Europa, corrupto e condenado, governa neste momento graças a um acordo com o Vox onde incluíram o desmantelamento da Unidade Valenciana de Emergência para investir diretamente nas touradas. Sim, a direita e a extrema-direita acabaram com a UVE.

 

 

Vejamos onde errou o Mazón: 

O Mazón pediu, 3 dias depois da tragédia, 500 militares, mas acabaram por chegar 5 mil, após a consideração do Governo Central. No próprio dia, Mazón destacou a UME (Unidade Militar de Emergências) só para Utiel, desconsiderando o risco existente nas demais localidades da região;
O Mazón, esperto e politiqueiro, criou, 5 dias depois da tragédia, uns grupos de trabalho de resposta imediata (sim, resposta imediata 5 dias depois). Quer ministros do Governo Central nestes grupos de trabalho e o Governo Central alinhou nesta emboscada;
O Mazón quer ministros do Governo Central sob as ordens dele para os responsabilizar, já que sabe bem que a responsabilidade dos ministros do Governo Central é pouca ou é menor do que a dele;
Existem relatos de bombeiros do País Basco e de outros locais onde denunciam que foram proibidos de viajar para Valencia. Quem impediu estas viagens é quem tem a competência da Proteção Civil da Comunidade Valenciana, o governo local;
Ainda hoje nos perguntamos porque o Mazón não demitiu a sua colega de Governo, Núria Montes, quando disse para os familiares das vítimas que tinham de esperar em casa e não podiam procurar os seus desaparecidos;
Ainda hoje nos perguntamos o que anda a fazer a conselheira do Governo valenciano e responsável pela proteção civil regional, Salomé Pradas, que assumiu que não conhecia o dispositivo das mensagens de alerta, enviada fora de horas aos habitantes da região no dia 29 de outubro às 20h;
Ainda hoje nos perguntamos porque a AEMET (até se tentou enlamear esta organização) lançou alertas vermelhos no dia 29 às 8h da manhã e a Proteção Civil regional avisou os cidadãos às 20h de dia 29;
Ainda hoje nos perguntamos porque é que o Mazón, no dia 29 às 12h, desvalorizou, em Cuenca, a tragédia, dizendo que às 18h já estaria tudo bem.

O Mazón entrou em shock e o melhor a fazer seria assumi-lo.

 

A dinâmica do Estado espanhol é clara. As Comunidades Autónomas têm autonomia para gestão de crises, caso não tenham essa capacidade política e operacional para o fazer, chamam o Governo Central, coisa que não fez.

Aqui, em Portugal, quando foram os graves incêndios na Madeira não tivemos dúvidas de quem eram os responsáveis, certo? O Governo Regional.

A desgraça é sem precedentes e houve erros na gestão, há erros na organização de voluntários e operacionais, há erros na transparência, houve uma sucessão de erros e uma administração que foi eleita para gerir os destinos de Valencia e dos seus habitantes.

Grupos de ultra-direita espanhola, apologistas do franquismo, encontram-se organizados na comarca de Horta-Sud desde o primeiro dia da tragédia, grupos como a Revuelta, que se fazem passar por voluntários, mas mais que não fazem que destruir o poder político e sobretudo, inventar “bulos” (como se chamam no Estado espanhol), ou seja, inventar mentiras.

Ao longo dos últimos dias temos visto uma catadupa de bulos propagados por ativistas de direita como Rubén Gisbert, Vito Quiles, Bertrand Ndongo e Ángel Gaitán, mas também por responsáveis políticos como o eurodeputado Alvise Pérez e jornalistas como Iker Jiménez.

O número de bulos, na sua maioria já desmentidos pelas autoridades locais e estatais e por trabalhos de investigação de alguns canais de televisão, é enorme, surgindo quase todos os dias:

Vito Quiles, e propagado por Alvise Pérez, denunciou que se estaria a deitar para o lixo a roupa doada pelos voluntários. Inclusive, gravou um vídeo no próprio aterro onde se via o momento. Rapidamente, as autoridades afirmaram que era roupa que os afetados pelas cheias deitaram fora, provavelmente estragada e cheia de lama;
Bertrand Ndongo, e propagado por Rúben Gisbert e Iker Jiménez, afirmava que existiram centenas de mortos no parque de estacionamento do centro comercial de Bonaire porque estariam 700 bilhetes do parque ainda lá dentro, de acordo com o sistema. Acabou por se confirmar que não existiram falecidos nesse local;
Propagou-se que se teriam derrubado dezenas de barragens e açudes na região, sendo um dos motivos das cheias. As autoridades confirmaram que o que se desmantelou foram pequenos muros e barreiras nos percursos dos rios, que em nada previnem as cheias;
A Secretária Geral do Ministério da Justiça teve que desmentir que estariam a enviar centenas de forenses por causa das mortes provocadas pela tragédia;

As autoridades competentes, em vez de estarem ao que têm de estar, passam a vida a desmentir bulos destas personagens.

Estes foram alguns dos bulos mais mediáticos dos últimos dias. Estes grupos de ultra-direita, organizados, só querem ganhar créditos cavalgando o caos e a desgraça da população, arranjando assim justificação às suas causas.

A página da rede social “X”, Spainball, ligada a estes grupos, denunciou erradamente que uma família de senegaleses estaria a roubar as ajudas dadas pelos voluntários e enviadas para Valencia. Ou inventaram áudios de supostos militares onde choravam porque tinham visto centenas de cadáveres no parque do centro comercial de Bonaire.

O Dani Desokupa, um conhecido influencer da ultra-direita, fez vídeos onde afirmava que iria fazer limpezas étnicas durante a noite, em Valencia. Angel Gaitán fez uma sondagem na rede social “X” onde dizia que iria dar a ajuda à localidade que tivesse mais gostos para ganhar visibilidade e monetização.

 

Precisamos estar atentos. 

 

 

Nota: O autor, Diego Garcia, é de nacionalidade espanhola.

Fotos DR

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