“Mamã, já estamos a sair.” foi a última frase de uma criança ao telefone com os familiares que ficaram no México. Esta criança foi uma das 50 mortes registadas, por asfixia e desidratação, em San Antonio, Texas, dentro de um camião. Mais uma viagem de mexicanos, hondurenhos, guatemaltecos e salvadorenhos que resultou em tragédia.
Aumentaram, com o endurecimento das medidas restritivas contra os imigrantes, as viagens clandestinas perigosas e as tentativas de saltar o muro.
A política de imigração “tolerância zero” não reconhece a dignidade de cada ser humano. É chocante sabermos que as crianças, filhas de imigrantes ou refugiados que tentaram passar ilegalmente a fronteira, são separadas das famílias e colocadas em jaulas. Jennifer Lopez (Porto Rico), que partilhou o palco com Shakira (Colômbia), chamou a tenção do mundo para esta realidade, durante o seu espetáculo na final da Super Bowl. Na parte final da performance, crianças latinas, incluindo a sua filha, surgiram dentro de gaiolas iluminadas, representando a repressão dos sul americanos nos Estados Unidos: “O conceito é que as próximas gerações não sejam oprimidas como nós fomos”.
No documentário “Jennifer Lopez: Halftime” (Netflix), a artista revelou a pressão a que foi sujeita para retirar as gaiolas do seu espetáculo, mas não cedeu. Recordo uma foto do fotógrafo Paul Ratje, da agência de notícias France Presse, que mostra um agente montado a cavalo a segurar um homem pela camisa e outro a tentar fugir. Noutra imagem, é possível ver outro polícia a mostrar as rédeas do seu cavalo de maneira ameaçadora contra um grupo de porto-riquenhos.
Estes dois recentes acontecimentos dramáticos exigem uma tomada de posição da comunidade internacional e a busca de soluções que promovam a dignidade de cada pessoa. Hicks informa que a sensação de nos sentirmos excluídos desperta no nosso cérebro as mesmas reações das dores físicas. A dignidade resulta da conexão connosco, com os outros e de um propósito de vida. Donna Hicks, professora e investigadora de Harvard, indica as chaves para a dignidade: aceitação da identidade do outro; reconhecer o outro; valorização, dedicar atenção e escuta; inclusão (fazer parte do grupo); equidade no tratamento; independência (empoderamento das pessoas); entendimento, o que os outros pensam importa; dar o benefício da dúvida; responsabilidade, assumir as ações e possíveis erros.
Entretanto, no quadro europeu surgem algumas iniciativas. O Reino Unido assinou um acordo com o Ruanda para enviar para este país migrantes e requerentes de asilo. Esta parceria de “desenvolvimento económico”, assim designada pelo Reino Unido, é atentatória da Convenção de Genebra para os Refugiados, subscrita por este país. Precisamos, urgentemente, de “soluções novas e inovadoras”, mas não deste tipo senhora Priti Patel (Ministra do Interior do Reino Unido).
A Alemanha dá novamente um bom mote. O Governo aprovou uma reforma da política migratória que possibilitará a regularização de mais de 100.000 estrangeiros sem autorização de residência, se, como é lógico, cumprirem determinados requisitos, desde logo não terem cometido crimes. “Trata-se de uma mudança de perspetiva, queremos que as pessoas bem integradas na Alemanha tenham verdadeiras oportunidades.” (Nancy Faeser, Ministra do Interior) A Alemanha tem um déficit de mão de obra de 400.00 trabalhadores…
Saúda-se a eliminação de anacronismos e a adoção de medidas modernas que se adequem às necessidades do país e aos desafios do mundo, contribuindo para a eliminação da desumanidade e promoção da dignidade.
(Foto DR)