O Partido Socialista renovou, nas últimas semanas, as suas estruturas concelhias. O processo, por se realizar em tempo de recesso dos períodos eleitorais municipais, não teve casos, talvez não tenha sido, sequer, notado pela população em geral. Braga é sempre uma exceção…
Preparam-se agora os processos de eleição dos dirigentes distritais e importaria que houvesse uma ponderação do que é o PS nos tempos de hoje, o que impede que se renove e se rejuvenesça.
Implica, pois, fazer a pergunta central – que partido é o PS no tempo de hoje?
O PS é o partido de poder desde 1995. Com curtos interregnos na governação, nunca deixou de estar presente nas decisões das políticas do Estado. Ora, esta realidade pode vir a criar graves problemas no dia em que, pela decorrência normal da alternância, for obrigado a um largo período de oposição.
É por isso que o PS fica em situação extremamente difícil quando perde uma câmara. Nem partido, nem militância, nem alternativa…
Mas há uma questão bem mais profunda que tarda em ser resolvida – que programa, que caminhos para o país assumem os socialistas nos dias de hoje?
A Declaração de Princípios que vigora é do inicio do século. Era, ao tempo, um excelente documento que teve a coordenação de Paulo Pedroso quando Eduardo Ferro Rodrigues era líder do partido.
Em 2015 houve necessidade de vencer a barreira da governação à esquerda. Pensava o PS que essa marca tinha mudado os outros partidos e que haveria condições para soluções duradouras e fiáveis. Não foi possível. Talvez um dia volte a ser possível!
Em 2022 o PS teve uma maioria absoluta e precisa de saber bem o que quer fazer com ela.
Há quase oito anos que a governação socialista vive em contingência. Primeiro foi necessário vencer os choques da Troika; depois, foi necessário superar a pandemia e os impactos que ela teve na economia e na sociedade; agora, convive com uma guerra que está a criar crises na segurança, na alimentação e no abastecimento energético. O PS tem estado à altura de todas estas circunstâncias, mesmo que tenha sido impedido de governar em tempo normal e de aplicar o seu próprio programa.
É aqui que entram os debates distritais que o PS vai fazer nos próximos dois meses. O normal será uma discussão entre a regionalização, a descentralização, as obras públicas e … o governo que não ouve os socialistas. O normal será não sair de nenhum congresso federativo nada que se veja.
Talvez faça sentido deixar aqui um desafio aos que querem liderar cada distrito, que querem ser a voz do partido em cada região – saltem da cadeira, ouçam as instituições, não utilizem só o Facebook e o email para se relacionarem com os socialistas e com a sociedade, ponham em causa as vossas certezas.
E não deixem de se sujeitar à linguagem binária dos jovens, não os que já são tão velhos como os mais velhos do PS, mas aqueles que se sustentam em novas ideias e novas visões de um socialismo moderado cada vez mais essencial ao mundo. E não usem as mulheres para cumprir as quotas, imponham regras de partilha dos objetivos, obriguem a que lutem pela consagração programática e pela aplicação exterior das suas bandeiras.
Emprego qualificado, salário digno, capacidade de construir uma vida; professores motivados e bem remunerados, educação adequada à realidade e não aos interesses das faculdades, soluções de formação superior multifacetadas; saúde bem gerida, resposta a tempo, integração conveniente dos subsistemas; economia sustentável, empresas de ponta, semana de quatro dias, sindicatos empenhados; energia com um mix adequado e sustentado em eletricidade e gás renováveis, território de carbono zero; cultura que atravesse os nichos elitizados, valorização das tradições e da etnografia. E que nunca se esqueçam os necessitados e os explorados. O PS deixou de ser marxista, mas não deixou de saber de onde vem. Está aqui o campo de debate para Portugal.
Mas importa, ainda, questionar o que é ser socialista hoje. A solidariedade entre pessoas e territórios; a democracia que vença a ausência de diálogo e supere a comunicação social partidarizada; a liberdade de pensar e de fazer, com vista à realização pessoal; a equidade que não multiplique pobres e servis; um aparelho do Estado que não escolha só os próximos.
Uma Europa de cidadãos e de nações, um projeto partilhado de regiões e municípios, uma visão integrada a caminho de uma escolha federal na moeda, nos tributos, nos salários, nos bens essenciais, na riqueza. Um mundo que se afirme policêntrico, tolerante, desmilitarizado, fraterno, uma reforma das instituições internacionais.
Estas são as marcas que o PS deve ponderar debater num tempo em que a discussão se revela difícil, num tempo em que o que remunera é elogiar quem nos pode favorecer. Sejam os militantes mais do que elogios, sintam que fazem parte de um grande partido, mas que esse partido só continuará a ser grande se se conseguir renovar a cada tempo.
Ascenso Simões
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