Do seu apartamento no Douro próximo da Foz, Catarina Martins vê as televisões e debita sentenças.
Para esta Senhora, que deveria ter ido à sua vida depois de ter reduzido o Bloco de Esquerda a pó, o Governo não investiu um tostão na prevenção dos incêndios florestais.
Diz Catarina: nada foi feito para limitar a área eucalipto; nada foi concretizado para a criação de unidades de gestão florestal; e nem sequer se estruturou uma carreira para os sapadores florestais.
Se Carlos Matias ainda estivesse na direção do BE, Catarina não teria dito tanta barbaridade. Mas a sua adoração por um ex-deputado completamente aluado, que Leiria mandou para casa, faz com que debite slogans que não agregam à realidade.
Respondamos às questões de Catarina. O Governo aprovou e os serviços públicos começaram a aplicar, uma nova forma de gestão das áreas de eucalipto. Não há mais, há menos, de melhor qualidade e melhor gerido. A certificação, questão essencial para a indústria portuguesa e para a exportação, é hoje uma certeza cada vez mais afirmada. Nos tempos do agora, a área do pinheiro bravo, fruto de muitas circunstâncias, revela-se muito mais preocupante para os proprietários e para o Estado.
Por último, os sapadores florestais. Se se comparar o que existia em 2015 e o que existe hoje só poderemos dizer que o país é outro. As brigadas duplicaram, o universo público viu crescer a sua capacidade operacional em quase 500%. Claro está que a ilustre Catarina não quer saber disso. O que lhe importa é que as brigadas das associações privadas passem a ser públicas, porque o seu grande sonho seria que toda a floresta fosse do Estado.
Mas vamos ao que interessa.
Portugal assistiu a um dramático Verão em 2017. Convinha que se dissesse que, perante aquelas circunstâncias nunca vividas e, portanto, nunca planeadas, não havia meios humanos e materiais que soubessem como resolver tais eventos.
É por isso que me dói a alma quando vejo um comandante de bombeiros, até um pobre coitado da EDP, a serem condenados pelo que aconteceu em Pedrogão.
Com exceção da inaudita visita do Presidente da República ao teatro de operações, uma tontice que desviou as atenções do dispositivo, quase tudo em Pedrogão, e meses depois no centro do país, era impossível de prever e de gerir.
Ao longo dos meus muitos meses como “tutela” da área da Proteção Civil entre 2005 e 2009, acompanhei eventos de toda a natureza que se foram passando em todo o mundo. Depois disso, enquanto professor do ISEC entre 2011 e 2013, tive oportunidade de convidar diversas personalidades para enquadrarem os riscos que Portugal vivia. 2017 estava longe de todas as previsões. Tenhamos consciência disso.
O que foi feito nestes últimos cinco anos? Muito, mesmo muito!
A Proteção Civil portuguesa é uma realidade difícil pelo número de operacionais que advêm de mecanismos onde a sociedade civil tem um papel. Não partilho a profissionalização total do sistema, mas o caminho seguido, que tem como base o princípio do empenho criterioso dos meios na relação entre sistemas, parece estar a dar frutos. Temos ainda de valorizar a relação do Ministério da Saúde com os bombeiros para melhorarmos o seu empenho na proteção e socorro.
Por último, a prevenção estrutural. Eu partilho da opinião de quem pensa que devemos avançar para uma outra visão integradora entre a AGIF e o ICNF e tenho para mim que António Costa já poderá ter opinião formada. Mas não é isso que está em causa agora. O que está em causa é se o Estado fez um caminho correto. E eu afirmo que sim. Desde 2009 que não se via uma política tão acertada.
Estruturação do território florestal privado (415 milhões de euros contratados), intervenção consistente em quase todo o território público (30 milhões de euros), uso das técnicas de fogo na prevenção e no combate (mais de 250 mil hectares), organização da rede de competências, inserção do cadastro dos IF’s na decisão operacional anual, organização da estrutura municipal de prevenção (25 milhões anuais de apoio), formação para primeira intervenção e para o rescaldo do dispositivo de prevenção estrutural (855 elementos). Tudo isto é um trabalho ciclópico do ministério agora tutelado por Duarte Cordeiro.
Mas há uma garantia que este governo tem e que não sabemos se se manterá no futuro – direção política. Entre 2005 e 2009, pela ação determinante de António Costa, essa direção política existiu sempre. Regressou progressivamente em 2016 e tem vindo a melhor significativamente. Foi essa direção política que fez com que tivéssemos avançado tanto e é essa direção política que também assume os sucessos, por vezes os insucessos, de uma empreitada nacional perigosa e dura.
Nos últimos dias voltamos a verificar essa liderança política. Costa sabe bem o que está em causa. Mas também pode estar mais descansado porque o país está preparado como nunca esteve.
Podemos ficar descansados? Não vamos ter perdas de vidas e de bens no futuro? Ninguém com bom senso pode responder a isso de forma cabal. O que é certo é que os incêndios deixaram de ser rurais ou florestais para passarem a ser, como na Austrália ou nos Estados Unidos, grandes e graves eventos que a intervenção humana pode minorar, mas não pode eliminar pela sua presença diabólica.
Ou seja, Portugal vai passar a viver em situação de risco máximo permanentemente. Estamos a falar de ocorrências que implicam outras visões e outras formas de intervenção, formas que vão obrigar o comandamento das estruturas públicas e a informação aos cidadãos a uma nova e profunda transformação.
Catarina poderia ter sido prospetiva e falar desta nova realidade. Optou por tocar em coisas que não sabia, eleger o uso da politiquice em tempo de emergência.
Ascenso Simões
(Foto DR)