“Os encontros de tias da Lili Caneças não superam este Tinto no Branco em matéria de charme?”
É que há sinais que são como a história do algodão. Se o Tribunal de Contas não tivesse indeferido o recurso sobre o chumbo da constituição da “Águas de Viseu”
É um princípio reconhecido pela sociedade que quando se querer resolver um problema doloroso, não se anda a falar nele na praça pública, muito menos se transforma a causa em reality show.
Partindo do problema real da falta de água devido à seca prolongada que afectou de forma drástica muitas zonas do País e também a nossa região e o nosso Concelho, a Câmara montou um espectáculo mediático e fez crer que se tratava de uma catástrofe de dimensões bíblicas, a que não faltavam os milagres, como o de fazer chegar a água a Viseu de comboio.
Só quando o Governo e outros autarcas começaram a assumir protagonismo nos média, o senhor Presidente considerou “haver excesso de comunicação sobre o problema”. E houve mesmo.
Sem querer assumir o papel de “cardeal diabo”, por estar ele a ser assumido há dois anos por Passos Coelho, direi que esta foi uma operação de fins múltiplos, em que a bondade de assegurar água potável às populações, não foi o único.
É que há sinais que são como a história do algodão. Se o Tribunal de Contas não tivesse indeferido o recurso sobre o chumbo da constituição da “Águas de Viseu”, com grande probabilidade este espectáculo mediático não teria atingido as dimensões que conhecemos.
Senão vejamos. Em Agosto, a preocupação tornada pública pelo Senhor Presidente, era com a açude da Maeira. Só que, em Setembro, véspera de eleições, o tema Maeira tornou-se delicado, não pela falta de água no Vouga, mas pela probabilidade de ali estar a chegar água poluída proveniente de um aviário. Até final deste processo, como demonstra a Informação que nos fez chegar, a Maeira desapareceu dos radares, sabendo-se, por minha constatação directa, que a sua situação não era melhor do que a da Barragem de Fagilde.
Depois os descuidos, já a operação estava em curso, denunciados pelas redes sociais, que mostravam os aspersores a regar abundantemente relvados em várias avenidas da cidade e as fontes ornamentais a projectar os seus artísticos jatos de água.
Havia que trazer água e quanto de mais longe ela viesse, mais impacto causava na opinião pública. Não havia alternativa de abastecimento na periferia do Concelho, fizeram crer. Guimarães, Trancoso, Lamego, etc, tudo ofereceu água a Viseu, mas comprada, que as Empresas Multimunicipais têm de pagar os substanciais salários aos seus administradores. E transportada num impressionante corrilório de centenas de camiões cisterna, de que se divulgaram abundantes detalhes sobre a empresa que fazia o transporte, os metros cúbicos transportados e até, o comprimento atingido pela fila de camiões. Tudo coisas importantes para resolver a falta de água. Afinal, veio a provar-se, que havia abundância de água aqui tão perto, a poucos quilómetros, ali na Barragem da Aguieira, o maior reservatório de água doce em território nacional, e que até podia ser transportada pelos carros dos bombeiros e das forças militares, vejam só. Mas não era tratada. Pois não, mas para isso lá estava a ETA de Fagilde.
Sabemos que foram feitos “furos horizontais” para reforçar o abastecimento a Fagilde, mas os estudos geológicos que todos podemos consultar na internet apontam para a existência de abundantes lençóis de água no subsolo da barragem que furos verticais (artesianos) poderiam ter trazido para a superfície. Também ficamos sem saber se a captação da Muna, que antes de Fagilde foi responsável pelo abastecimento de água à cidade, teve problemas ou cumpriu o seu papel sem constrangimentos.
Queixa-se o senhor Presidente de que os seus pedidos e alertas sobre o risco da falta de água não foram escutados pela “Administração Central”. Será que inclui nessa surdez e insensibilidade estatal o governo que integrou? Uma constatação é irrefutável. A Câmara demorou 4 anos a reconhecer o problema. Isto porque, compulsado o documento “Viseu Primeiro 2013-2017”, não encontrei nele uma palavra que fosse sobre esta estratégica questão.
Afinal o problema está diagnosticado e a terapêutica prescrita: aumentar a capacidade de armazenamento em Fagilde. Solução que afinal poderia ter sido encontrada nestes quatro anos, com um custo de pouco mais de 3,5 milhões de euros, o correspondente a três anos de lucro dos SMAS.
Mas o importante é a constituição da Empresa Intermunicipal “Águas de Viseu” e para justificar a sua existência, como alternativa há indeferida “Águas de Viseu”, Empresa Municipal, há que dramatizar até ao limite o problema da falta de água, a falência do actual sistema e valorizar a solidariedade das Empresas Multimunicipais que “acudiram” a Viseu.
É o que se depreende quando se escamoteia a possibilidade já estudada e prevista de transvase da barragem da Aguieira para Fagilde e se aponta como solução uma “adutora” da Barragem de Balsemão, junto ao Douro, até Viseu. É fácil de perceber a que “moinho se quer levar esta água”.
A voz popular aconselha, em matéria de vinhos, que não se façam misturas entre brancos e tintos, para preservar o equilíbrio. Confesso que, depois de tanto tinto no branco e branco no tinto, fiquei sem saber se estava a ler a informação do senhor presidente à Assembleia ou um comunicado de imprensa da “Viseu Marca”. O mais provável é ter ficado perturbada com a revelação de estar na presença “do mais charmoso evento do País”. Só pode ter sido. Mas senhor Presidente, responda-me, para sossego das minhas dúvidas sobre a matéria, nem mesmos os encontros de tias da Lili Caneças superam este tinto no Branco em matéria de charme?
Já quanto às mil pessoas na sala, só acredito se foram conferidas pelos torniquetes da Feira de S. Mateus, equipamento idóneo que sabe contar até um milhão.
Isto para dizer, senhor Presidente, que as iniciativas valem por si mesmas, pela apreciação que os participantes fazem delas. Se são efectivamente boas as pessoas saberão reconhecê-lo e divulga-lo e não tenho dúvidas de que esta terá sido uma boa proposta cultural. Este panegírico avassalador que introduz na sua informação só desvaloriza o mérito do que se faz.
O facto do “Castelo de Natal” instalado no Rossio ter vindo de Nice, França, acrescenta alguma coisa à sua beleza e atractividade? É uma evidência que a cidade está bonita. Mas estou em crer que os cidadãos que nos visitam e os habitantes da cidade não se importam com a origem geográfica das luzes de Natal, apenas querem usufruir do encantamento que elas proporcionam e do espírito de paz e fraternidade que elas representam. Agora sem ironia: Boas Festas!