Os empatas e o sortudo

Quanto ao Chega, foi um estoiro. Da ambicionada vitória aos mais moderados quatro deputados reclamados pelo embaixador, um peixe fora de água, um clamoroso erro de "casting", aquele fiozinho ao pescoço era um "must", contentou-se com dois representantes. Face às legislativas de Março, desceu para metade, com estrondo e fragor.

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  • 13:29 | Segunda-feira, 10 de Junho de 2024
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No final da noite, chegou o momento alto. Desvendou-se o mistério da notada ausência de António Costa na caravana do PS. Montenegro anunciou que apoiaria o ex-PM para o cargo de presidente do Conselho Europeu, e soube-se que aquele só aceitaria ser candidato se tivesse o apoio do governo português. Para o obter, não podia envolver-se na disputa.

Nada em Costa, pragmático e tacticista, negociante e calculista, livre de afectos e memórias, é estranho ou por acaso. Na linha dos seus objectivos pessoais, num abrir e fechar de olhos, o essencial passa a secundário e descartável. Mas, diga-se em abono da verdade, é um homem com sorte.

De quase cadáver, em 2015, incapaz de derrotar a PAF, desgastada por anos de uma dura austeridade, salvo no patíbulo pela mão austera de Jerónimo seguido por Catarina, que lhe estenderam o bilhete premiado do “Euro Milhões”, está a um passo do ambicionado cargo europeu, em Bruxelas, no luxuoso Edifício Europa.


Tão lesto a pedir a exoneração, até a demissão do governo lhe caiu como sopa no mel, livrando-o das obrigações nacionais e ajustando calendários. Quanto ao mais, nos últimos dias, de 6 a 9, 360 milhões cidadãos dos 27 estados europeus foram chamados às urnas para elegerem 720 deputados ao Parlamento da UE. Em Portugal, a abstenção foi de 63.6%, menos do que os 69.3%, em 2019, e a primeira vez que caiu, desde 1999, quando foi de 60.1%. Apesar do fim-de-semana alargado, que antecipava os piores cenários, o voto antecipado e o voto por mobilidade poderão ter contribuído para que os valores não fossem tão desanimadores. A curiosidade está em que continuamos a ser dos povos mais europeístas e dos que menos votam.

O PS, com mais 0.9 pontos e mais um deputado, ganhou por poucochinho e teve uma vitória magra. PNS, desforrando-se das perdas centesimais de Março, livrar-se-á da azia que o consome desde então e lhe tirava raciocínio, serenidade e quietação. A vontade que se sabia larvar no seu interior para chumbar o próximo orçamento deve ter sido travada.

O PSD perdeu à tangente, confirmando-se a tradição de os partidos que estão no governo serem derrotados. A escolha do novato Bugalho, que pode ser muito talentoso para o comentário político, mas não tem jeito para a rua nem para se misturar com o suor dos populares e dos feirantes, também não augurava nada de estimulante. A esperança da AD estava no tuque-tuque que o governo atulhou de anúncios e medidas. Contra ventos e marés, que os oportunistas se encarregaram de agitar, o Bloco Central está para durar.

A meio da tabela, outro empate entre os radicais e os liberais. Para a IL, foi uma vitória, talvez o único partido verdadeiramente ganhador, que se estreia em Estrasburgo. Quanto ao Chega, foi um estoiro. Da ambicionada vitória aos mais moderados quatro deputados reclamados pelo embaixador, um peixe fora de água, um clamoroso erro de “casting”, aquele fiozinho ao pescoço era um “must”, contentou-se com dois representantes. Face às legislativas de Março, desceu para metade, com estrondo e fragor.

É, cada vez mais, um partido unipessoal, sem Ventura o agrupamento eclipsa-se e fica-se pelas fímbrias do escrutínio. Talvez este descalabro conduza a moderação na vozearia e no vervo disforme, acalmando quem se julgava o dono de tudo, até da moral e da razão.

No fundo, num quase apagamento que só causa danos à saúde da democracia, a esquerda afundou-se, continuando um processo de erosão. PCP e BE, que se apresentaram às eleições com os dois cabeças de lista mais bem preparados, elegeram cada um o seu representante, perdendo o que já tinham. Perante a anunciada, e só muito mais rarde confirmada, descida da votação no PCP e no BE, o mourisco e bulhento ex-alferes Nuno Melo, instalado no palanque só seu porque lho emprestaram, concluiu que não compensa ser muleta do PS. Veremos, daqui a 2 anos, se ao CDS compensa ser o broche conveniente no lustroso traje domingueiro do PSD.

No “Velho Continente”, Portugal e Espanha portaram-se bem. Na Áustria, na Itália e na França ganhou a extrema-direita, que, fortalecida, ficou em segundo lugar na Alemanha e na Hungria. Se a estes resultados, somarmos as eleições antecipadas em França com a provável vitória da extrema-direita, e a possível eleição de Trump, o mundo pode ficar muito perigoso.

Para finalizar, estes “tugas” são uns empatas, no topo, no meio e no fundo da tabela, neste tabuleiro de xadrez que não ata nem desata.

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Publicado em Opinião