Os portugueses sofrem de um complexo de orfandade que os psicanalistas, se é que ainda o não fizeram, poderiam avaliar, em toda a sua extensão e implicações. Em tudo e em nada encontram um pai, teimando em tomar o seu por ausente. É o salvador que há-de vingar-se de Alcácer Quibir e aparecer numa densa manhã de nevoeiro, renascido das cinzas em que os historiadores insistem em o dar por moribundo, vagueando entre cá e lá.
Já tivemos um general, também podemos ter um almirante, dizem. Fazemos heróis com a mesma facilidade com que trespassamos inocentes. Inebriamos e embebedamo-nos com a mesma ligeireza do voo de uma garça. E descobrimos abundância onde há cumprimento de missão. Para o endeusamento e para a glorificação, não faltará muito, mesmo que em desmesurado exagero. Às vezes, mais parece que carecemos, doentiamente, de um anjo com asas alvas, que nos abençoe e nos proteja de descaminhos. Valha-me Deus.
Cada um no seu lugar, vale a pena recordar. Deixemos o senhor cumprir a missão que lhe foi confiada, e desejar-lhe, sinceramente, as maiores venturas. Mas ali, naquele lugar, com aquele foco. Além do mais, até o pé poderia ser pequeno para as botifarras que (não) teria de calçar. Apetecer mais do que isso é não termos memória. Bem recente.
(Foto DR)