O processo de escolha do novo Procurador-Geral da República (PGR) correu sem especulações jornalísticas sobre putativos nomeáveis, longe das intrigas palacianas, que alimentam feridas intestinas, a purgarem surdas, e foi célere na selecção da personalidade, talvez pela afinidade política que junta PM, a quem cabe a proposta, e PR, que tem a palavra final, nomeando.
No maior recato, quando o assunto estava em banho-maria, surgiu a notícia. Louve-se o modo discreto como tudo se desenvolveu e o tempo em que ocorreu, antes do fim do ciclo de Lucília Gago, evitando o desgaste, fugindo à erosão, sempre maus conselheiros, em matérias tão complexas, que reclamam doses bastantes de ponderação e de equilíbrio.
Surpreendeu que, da direita à esquerda, tenha descido uma cortina de quase unanimidade sobre Amadeu Guerra, pontuada aqui e ali por uma hesitação, menos por convicção e mais por obrigação, no cumprimento de uma agenda, que se torna imperativa por exigência das massas, férteis nos resmungos, a pedirem constantes ajustes.
Independentemente de tudo o resto que já se sabe, da competência e da experiência do magistrado jubilado, tão incensadas nas últimas horas, de ter trabalhado muito de perto com Joana Marques Vidal, razão muito kitsch, ao novo PGR vão colocar-se cinco prioridades, de que dependerá o sucesso do seu mandato.
Vamos por partes, que é às fatias que o melão se come e é mais saboroso.
As fugas de informação. É anormal e pidesco que a comunicação social saiba de antemão as acções que o MP desencadeia, conhecendo os locais das buscas e os suspeitos implicados, acompanhando-as de câmara em riste e microfone atrevido, dando uma imagem triste dos meandros da nossa justiça. É absolutamente dispensável o espalhafato no que se quer discreto. Conter este julgamento público por antecipação, esta devassa, esta grosseira ofensa à privacidade, direito que é devido até ao mais perigoso delinquente, não vai ser tarefa fácil. São untuosos e subterrâneos os trilhos da justiça portuguesa. Fechar esta torneira da coscuvilhice, degolar esta garganta funda maldizente, identificar e isolar os “bufos”, será tarefa hercúlea. Veremos aí também a sua tão glosada capacidade de liderança.
A solidez das provas. É risível que muitos dos mais recentes processos, envolvendo figuras mediáticas, as que mais despertam os apetites oleosos da populaça, acabem em nada, morrendo às mãos dos juízes de instrução, por insuficiência de provas. Alguns dos suspeitos das piores sacanices e malfeitorias, saindo mesmo sem qualquer medida de coacção. Dando de barato que a apreciação da matéria criminal é sempre subjectiva, o MP não se livra da acusação de um amadorismo impensável, que mancha as suas vestes de suposto rigor e descredibiliza a sua missão
O bom senso. Aguarda-se que as estranhas operações “selectivas”, feitas no período das campanhas eleitorais, terminem de vez. O argumento de que a justiça tem os seus tempos não seria tacanho e curto, se não se desse o caso de coincidirem com os tempos da política. São sobreposições a mais para que passem despercebidas. Vem campanha e há candidatos e logo vêm para a rua as brigadas dos bons costumes, os polícias da honradez, vasculhando minudências, descascando amendoins.
Finalmente, só referir que já dei por mim a recordar excelentes segundas linhas que deram em rotundos fracassos, quando à proa da barcaça.
PS : Que é feito dos fugitivos de Vale de Judeus?