Mesmo com a espiral inflaccionista, os impactos da guerra na Ucrânia e o crescimento das taxas de juro, o orçamento para 2024 apresenta um excedente de 0.2%, uma redução da dívida pública, a maior diminuição de impostos sobre o rendimento das famílias, uma subida histórica do salário mínimo nacional, mais 7.9%, para 820€, e das pensões, 6.2% em média, e um aumento moderado dos salários da função pública, mais 52 €, e das prestações sociais.
Dois excedentes seguidos, depois dos previstos 0.8% do PIB em 2023, é um facto inédito e sem precedentes na democracia portuguesa.
A redução da dívida, como não se via desde 2009, baixa dos 100%, e é a 7.ª que mais recua no mundo, só superada pela da Grécia, na Europa.
A despesa pública cresce excessivamente, 10%, para 123.019 milhões de €, aumenta, com os salários, as pensões, as prestações sociais e o investimento, a darem o seu contributo, e a receita, que se fixa no total de 123.682 milhões de €, também sobe 60 mil milhões de €, muito impulsionada pelos impostos indirectos, menos perceptíveis, mas mais injustos socialmente.
A receita fiscal avançará 4.8%, ficando nos 60 mil milhões de €, e a carga fiscal será de 38.2%, o maior valor de sempre, em resultado da subida daqueles impostos, sobre o tabaco, bebidas alcoólicas, o IVA, mais 8%, o ISP, mais 13%, o IUC, com um agravamento substancial para 3 milhões de veículos de passageiros e 500.000 motociclos anteriores a Julho de 2007, que permite receber 84 milhões de €, o ISV, e a eliminação do IVA zero, logo agora que o cabaz alimentar não estava tão caro desde Abril.
Com a cobrança dos impostos indirectos, 3.3 mil milhões de €, que terão um agravamento de 9%, pagaremos todos muito mais. Assim, é bom que tenhamos em mente que os portugueses ganharão mais na hora de receber, por via das novas tabelas da retenção na fonte, mas pagarão mais na hora de consumir. O governo dá 1milhão e 682 mil € com o alívio do IRS, e tira 2 milhões e 735 mil € com a cobrança dos impostos indirectos, isto é, os impostos indirectos superam a descida do IRS. Um truque.
Dir-se-á que, se o Orçamento fosse mais longe na política de rendimentos e mais ousado na redução da carga fiscal, o défice e o superavit ficariam prejudicados. No resto, diga-se que os bons indicadores referenciados no início se devem mais à cobrança recorde de impostos, e menos à eficiência e racionalização da despesa pública, ao crescimento da economia, que não passa dos 2%, de forma sustentada, e está pior do que o governo diz, e à sua produtividade e competitividade.
Não será errado dizer-se que a economia é o parente pobre deste Orçamento. E não se vêem soluções novas para os grandes problemas que, de momento, mais afligem os portugueses, a habitação, a saúde e os professores.
Continuar a carregar nos impostos, como via para suportar a despesa, adiar a reforma fiscal, manter o modelo económico, e não apostar na racionalização da administração pública, não me parece que seja o melhor caminho para um futuro risonho.