O empata

A margem de vitória do PSD, 9 décimas, é curtíssima, o que não deve impedir o PR de indigitar Montenegro para PM. Nunca os dois maiores partidos chegaram tão próximos à meta. E só uma hecatombe nos círculos eleitorais da Europa e do Resto do Mundo, que elegem 4 deputados, alterará o vencedor de uma noite imprópria para cardíacos.

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  • 17:00 | Segunda-feira, 11 de Março de 2024
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A abstenção aplaudida, 33.8%, é a mais baixa desde 1995, quando o país, e mesmo o PSD, estavam fartos do cavaquismo.

A margem de vitória do PSD, 9 décimas, é curtíssima, o que não deve impedir o PR de indigitar Montenegro para PM. Nunca os dois maiores partidos chegaram tão próximos à meta. E só uma hecatombe nos círculos eleitorais da Europa e do Resto do Mundo, que elegem 4 deputados, alterará o vencedor de uma noite imprópria para cardíacos. Porém, se aí o resultado de 2022 se repetir, o que é improvável, o PS elegerá 3 deputados, o PSD 1, e no final ficarão com 80 deputados, e o PS a poder reclamar a vitória. E, no dia 20, tudo voltará a zeros.

A IL subiu a votação e manteve os 8 eleitos, passando a quarta força política, ultrapassando a CDU e o BE. O BE subiu a votação e manteve os 5 deputados. A CDU teve menos votos, perdeu 2 deputados e ficou sem representantes em Beja, Évora e Portalegre. O Livre obteve 4 mandatos e conseguiu o objectivo de ter um grupo parlamentar. O PAN subiu em número de votos, segurou a líder, que foi reeleita, mas falhou o objectivo de alcançar um segundo mandato, mantendo-se com uma presença residual.


A esquerda regista uma das piores derrotas de sempre, toda junta tem os mesmos mandatos do que a soma da AD com a IL.

A votação do ADN, que cresceu 900%, face às anteriores eleições, resulta de um equívoco, a confusão das siglas com a AD. Negacionistas da Covid e da crise climática, era só o que nos faltava.

O Chega teve uma subida espantosa, cresceu em votos, mais de 1 milhão, e em deputados, passando de 11 para 48 assentos no hemiciclo. E é a terceira força política que, a partir de agora, não pode ser desvalorizada nem ignorada. O tempo dirá, se esta é uma votação de protesto, circunstancial e efémera, ou se estamos na presença de uma alteração estrutural, profunda, no perfil do eleitorado.

Para o ádipo PS, era uma luta difícil. Evitou a goleada, mas não impediu a derrocada, face aos resultados de 2022. Perdeu a maioria absoluta, não alcançou uma maioria relativa, teve menos meio milhão de votos, e viu a sua bancada emagrecer 40 lugares.

Consumido pela tristeza de uma maioria absoluta desastrada, desfeita em confusões, tropelias e amadorismos, que perdeu por culpa própria, com um líder recente, vergastado por episódios infelizes, enquanto governante, e com 8 anos de desgaste acelerado, não seria de esperar muito mais. Resta-lhe uma cura de oposição e competência para reflectir sobre os erros do passado e sobre a estranheza de em quase todos os círculos eleitorais ter perdido deputados para o Chega, ideologicamente nada afim e tão distante. Só um descontentamento muito grande com a governação recente pode explicar esta transferência inesperada. Seria mais lógico que crescesse à custa da AD.

A AD, no seu conjunto, tem os mesmos votos que o PSD e o CDS alcançaram em 2022 (29.27%). Com a aliança, ganhou o CDS que, no campeonato dos pequeninos, cantou vitória. Embora com um primeiro lugar à tangente, por uma unha negra, tem toda a legitimidade para formar governo, que passará no Parlamento, mas não sobreviverá ao primeiro orçamento.

Pedro Nuno Santos já disse que não pode contar com o PS, que “não vai criar impasses constitucionais, mas não vai viabilizar orçamentos de direita”, [ isto em concreto, significa o quê?] e Ventura, deslumbrado com a votação, tudo fará para apear Montenegro.

Vai ser muito difícil governar e poucos aceitarão ir para o governo, com tão curto horizonte temporal. Os cenários de governavilidade são frágeis. Anunciam-se tempos de instabilidade e incerteza. Se valesse o interesse nacional da estabilidade, o novo governo teria dois orçamentos aprovados para mostrar o que vale, mas as agendas e as clientelas políticas não irão permitir a temporização.

Montenegro não terá ocasião para se mostrar. Ventura porá toda a areia na engrenagem, de modo a precipitar novo acto eleitoral, a que se apresentará Passos Coelho, sedento de voltar ao poder, e mais disponível para um acordo com o Chega. Resta saber se PNS, digerindo mal as perdas, embarca nesse veleiro, de viagem procelosa e retorno incerto.

Não estou seguro do fim do bipartidarismo, que, com o nome de rotativismo, nos faz companhia, desde os tempos da “Regeneração”, período político nascido do golpe militar do Marechal Saldanha, em 1851. Desde então, e até aos anos finais de D. Carlos, os partidos Regenerador e Progressista alternaram no poder. Até que este caminho vicioso, interrompido pela Ditadura e pelo Estado Novo, se dê por findo, ainda muito água vai correr sob as pontes.

Entretanto, o Bloco Central deve avaliar com humildade e serenidade a forma como os seus directores partidários têm feito política, nestes 50 anos em que foram donos e senhores poderosos de uma coutada, condoída, exaurida e espezinhada, que sucumbe perante os valores que não são os de Abril.

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Publicado em Opinião