O debate e a vacuidade de tudo isto
Quem ganhou o debate de 4ª feira passada entre Pedro Passos Coelho e António Costa? Não sei, mas sei quem perdeu. Perdi EU, como cidadão e como eleitor. Não gostei nada do debate entre Passos Coelho e António Costa. De forma que nem o vi até ao fim. Na verdade: – Não gosto de debates […]
Quem ganhou o debate de 4ª feira passada entre Pedro Passos Coelho e António Costa? Não sei, mas sei quem perdeu. Perdi EU, como cidadão e como eleitor.
Não gostei nada do debate entre Passos Coelho e António Costa. De forma que nem o vi até ao fim. Na verdade:
– Não gosto de debates em que os 3 jornalistas se intrometem, sendo elementos ativos, sem fazer aquilo que devem: introduzir temas, controlar o tempo e fazer fact checking. De que serve um jornalista que não está informado e não solicita esclarecimento quando algo que é dito não corresponde à verdade?
– Não posso gostar de debates que pretensamente são sobre o futuro e se estendem por 90 minutos a falar do passado, sem nenhum ensinamento, sem nenhuma reflexão crítica e sem humildade, insistindo num modelo de liderança forte, assertiva, musculada, de quem não se arrepende de nada, em vez da preocupação por dar o exemplo e contribuir para a participação e mobilização da sociedade;
– Não gosto de debates em que os dois adversários falam para si próprios, numa linguagem hermética que não revela a mínima intenção de esclarecer os eleitores. Ficou claro que esta forma de fazer “política” não quer mudar o mundo, mas tao somente alimentar um circuito fechado de pessoas e interesses;
– Não gosto deste circo mediático em que o que interessa não é o que dizem as pessoas, mas tão-somente quem pretensamente ganhou a disputa, para depois as máquinas partidárias fazerem um lamentável e chocante espetáculo de claque barulhenta e inconsequente;
– Sinto-me insultado com este comportamento;
– Não gosto de debates em que os dois candidatos a PM se esquecem da EDUCAÇÃO (cada vez menos um fator de esperança no futuro com a gradual destruição da Escola Pública em função da crescente privatização com os olhos postos nos rankings), do ENSINO SUPERIOR, da CIÊNCIA, da JUSTIÇA, da EUROPA, dos REFUGIADOS (se calhar a crise das nossas vidas), da POBREZA, da degradação do TRABALHO, do DESENVOLVIMENTO REGIONAL (se calhar a vertente mais importante para o EMPREGO), dos FUNDOS COMUNITÁRIOS (o nosso único porta-moedas), entre muitos outros assuntos relevantes;
– Não gosto de debates em que sinto que o cidadão não é a preocupação essencial de quem fala, mas antes um efeito colateral de estratégias de poder para as quais, de facto, não tenho a menor paciência;
– Não gosto de debates transformados em espetáculos mediáticos em que conta tudo, a coreografia, o guarda-roupa, a fotografia, as qualidades de representação dos protagonistas, o trailer, a antestreia, etc., menos o conteúdo e a fundamentação do que é proposto.
E depois há José Sócrates. Numa situação normal o ex-PM seria somente motivo de uma profunda e séria reflexão sobre a qualidade das pessoas que elegemos, em todos os partidos do arco da governação, sem nenhum tipo de escrutínio público, para os mais elevados cargos da nação, o que é o mesmo que dizer, sobre a qualidade da nossa democracia. O facto de José Sócrates ter tomado conta da campanha eleitoral, e do referido debate, ao ponto de ser mais relevante aquilo que ele come ao jantar do que as opiniões dos candidatos a PM, diz tudo da enorme vacuidade em que se transformou, 41 anos depois, a vida pública e política portuguesa.
Repito, não sei quem ganhou aquele debate, nem me interessa. Eu perdi, definitivamente.
(Diário As Beiras de 11 de Setembro de 2015)