Parece que o professor Adão e Silva, académico de reconhecidos méritos e militante destacado do PS, ex-secretário nacional, e comentador assumido na defesa das políticas governamentais, foi nomeado para comissário executivo das celebrações dos 50 anos do 25 de Abril.
O senhor cobrará até 4.500 € por mês, por um período que se estende até 31 de Dezembro de 2026, isto é, um total de 320.000 €, em troca de um trabalhinho de preparação das celebrações, que durará 5 anos, 6 meses e 24 dias. E, atenção, pode acumular com outras actividades remuneradas, nomeadamente, a docência. Fatinho, à medida do incumbente. Nada mau. O que não virá aí de fogo de artifício e venda de cravos vermelhos. Esperam-se banquetes, tapetes vermelhos, ajustes directos a empresas especializadas em grandes eventos, convites a chefes de Estado.
Só por este detalhe, é um arraso, uma viga que cai sobre os ombros de um governo já frágil, trôpego, esgotado, virado para dentro, sem chama. Aguenta-se por via de uma chocante falta de comparência da oposição no duelo político.
Dar a este comissário as melhores regalias concedidas pelo Estado é um ultraje, uma vergonha, um abuso, um insulto. Num país que já sofre das maiores crises por que alguma vez passou, com uma dívida pública obscena, com despedimentos em série, com falência diárias, com a bomba atómica das moratórias, prestes a explodir, com uma exuberante carga fiscal, com o sofrimento de milhares de famílias pela perda de entes queridos, às mãos da pandemia, com rastreios e diagnósticos do cancro atrasados, com o entupimento dos serviços hospitalares, ser-se perdulário é uma ofensa gratuita a um povo que, desgraçadamente, continua a não merecer a atenção das elites do costume, bem instaladas, surdas aos gemidos, mudas nas soluções.
Que nos preocupe, já não há só o défice público. Acompanha-o, agora, o défice do bom senso, da conveniência, do pudor.