Medida de apoio ao interior para quem vive no litoral

Não fará mais sentido apoiar quem já vive no interior, proporcionando-lhes melhores condições de vida?

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  • 0:12 | Quarta-feira, 12 de Fevereiro de 2020
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Sempre me irritaram as campanhas de captação de novos sócios, quando ancoradas em benefícios para estes e total desprezo por aqueles que já o são. Afigura-se-me igualmente irritante que sejam tratados com todos os “salamaleques” clientes que vão pela primeira vez a um determinado restaurante e se negligenciem os habituais, pressupondo a sua eterna fidelidade.

Pois bem, em ambas as circunstâncias, o desfecho não se afigurará muito diferente. A possibilidade de perder o cliente diário ou o sócio mais antigo é enorme quando estes não são acarinhados e respeitados. A aposta em aumentar o número de sócios ou de convivas só será bem-sucedida se for combinada com o bom trato aos que até então foram o esteio e o garante da sua existência.

Vêm estes dois exemplos a propósito da medida do Governo que dá até 4800€ a quem decidir ir viver no interior. A linha de financiamento vai ser aberta até Março deste ano, segundo a ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Ana Mendes Godinho.


Não fará mais sentido apoiar quem já vive no interior, proporcionando-lhes melhores condições de vida?

São milhares de pessoas que persistem e empreendem no interior do país. São milhares de pessoas que pagam a fatura, bem cara, da interioridade. São milhares de pessoas que, há décadas, assistem ao desmembramento das suas famílias que emigram. São milhares de pessoas que perderam escolas, postos de correios, centros de saúde, tribunais. São milhares de pessoas que não têm transportes públicos decentes e boas acessibilidades. São milhares de pessoas que assistem aos investimentos de milhões nas grandes áreas metropolitanas e de tostões nos seus territórios. São milhares de pessoas que sonham com um país menos inclinado para o litoral, mais justo e com menos desigualdades sociais. São milhares de pessoas que merecem ver a sua resiliência e o amor às suas raízes contrabalançadas com estímulos capazes de mitigar as barreiras da interioridade.

Esta medida terá a melhor das intenções, mas poderá exacerbar as desilusões de todos os homens e mulheres que nasceram, cresceram e mantêm o interior nos seus corações. Para estancar a desertificação do interior, as primeiras medidas de apoio terão que ser direcionadas para quem vive no território e não para quem possa putativamente vir a viver. Somos nós, as gentes do interior que, se nos sentirmos bem, apoiados e com uma boa qualidade de vida seremos os embaixadores do território, empreendedores e angariadores de novos moradores.

Só assim será possível potenciar a medida do Governo que limita os vistos gold apenas a quem compra imobiliário no Interior. De outro modo, estes paliativos não passarão disso mesmo com consequências, também elas negativas, noutras esferas:

“A limitação dos vistos gold apenas a quem compra imobiliário no Interior já levou ao cancelamento de contratos de promessa de compra e venda ou mesmo escrituras para adquirir casas nas grandes cidades portuguesas.” (TSF, 07 de fevereiro, de 2020)

Caricato, Portugal paga aos seus cidadãos urbanos para emigrarem para o interior e quer cobrar aos estrangeiros obrigando-os a investirem no interior…

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Publicado em Opinião