O país vive uma espécie de esoterismo político em que nada parece bater certo. Por um lado, a esquerda da esquerda proclama, a partir dos livros escritos por Enver Hoxha na Albânia da década de 1950, uma economia fechada. Preços tabelados, mais défice e mais dívida, ataque aos comerciantes burgueses de todos os tipos. Por outro, a direita toda junta, a roer-se pelo facto de não poderem voltar a dizer que os socialistas são despesistas, que voltaram a levar Portugal à bancarrota. Esse argumento, por natureza falso, não poder ser usado é uma chatice…
O Governo, neste primeiro ano da sua maioria absoluta, teve coisas boas e menos boas. Das menos boas parece ter António Costa tirado as lições que importavam; nas boas interessa relevar toda a ação do Executivo perante a inflação e os impactos da guerra.
Portugal notou um desempenho muito positivo no que respeita à execução do Orçamento de 2022. Mesmo com o maior crescimento desde 1990, o déficit de 0,4% do PIB é, porém, uma quase vitória. Portugal poderia ter atingido um superavit que seria excelente para o nosso posicionamento nos mercados financeiros e para uma recuperação acelerada da cotação pelas principais notadoras. Mas é este défice bondoso que autoriza agora um reforço da política de ajudas às famílias e às empresas sem que se coloque em causa o futuro.
A inflação, nascida na pandemia e ampliada pela invasão da Ucrânia, é hoje o principal problema das economias ocidentais. Habituados a um aumento dos preços muito contido e a juros baixos, os europeus viram-se perante realidades que haviam marcado o final da primeira década deste século.
A questão que se coloca hoje é a de saber se o Governo andou bem em todas as medidas que tomou ao longo do tempo, e a resposta é francamente positiva.
Catarina Martins diz que é necessário tabelar administrativamente o preço dos produtos. A líder do Bloco sabe que preços tabelados só existem na Venezuela, na Nicarágua, em Cuba e na Coreia do Norte. Portugal passaria a integrar esse heterodoxo zoológico político.
Iniciada no inverno de 2022, a invasão da Ucrânia veio introduzir graves problemas nos sistemas energéticos europeus. Em boa verdade, a cadeia de fornecimento foi interrompida de forma abrupta e os mercados demoraram quase um ano a normalizar os abastecimentos, a garantir novos fornecedores.
Em abril, para fazer face aos primeiros impactos, é aprovado um apoio excecional de 60 euros para as famílias mais vulneráveis, apoio que foi reforçado, no mesmo valor, em julho. Tratou-se do universo de beneficiários que também era abrangido pela tarifa social na energia.
Em maio foram aprovadas as primeiras medidas destinadas a conter os custos da eletricidade e do gás natural a montante do cliente final. A criação de um mecanismo de limitação de preços no grosso, a sua implicação no retalho, os apoios às empresas gasodependentes, a reabertura do mercado regulado com tarifas muito mais baixas do que no livre comércio, permitiram, só entre junho e dezembro de 2022, uma redução de 20% do preço da energia elétrica e uma poupança de 489 milhões de euros.
É muito difícil fazer entender estas medidas a cada um dos portugueses que, mesmo assim, viram aumentar a fatura, mas Montenegro sabe bem os enormes ganhos para o país quando comparamos com a realidade para lá dos Pirenéus.
Em setembro foi aprovado o primeiro grande pacote anti-inflação. O valor dos apoios é astronómico – 2,5 mil milhões de euros. O pagamento de 125 euros a todos os cidadãos com rendimento abaixo de 2.700 euros, o apoio acrescido de 50 euros a cada descendente até aos 24 anos, o suplemento de pensão que implicou uma valorização de mais de 7% das reformas, a descida do IVA da eletricidade (a somar à implicação do mecanismo) de 13% para 6% com o desconto de 10% na fatura do gás, a suspensão do aumento da taxa de carbono somada à devolução da receita adicional do IVA e à redução do ISP, que impediram o cavalgar da gasolina e do gasóleo, a subida limitada das rendas e das portagens e, ainda, o congelamento dos passes dos transportes, foram as medidas que atacaram os grandes problemas que se viviam e ainda vivem.
Em outubro são conhecidas as medidas destinadas às empresas. A majoração dos custos de energia em sede de IRC entre 20% e 40% dependendo dos sectores, implicando uma redução de €40 MWh na energia consumida pela indústria gasointensiva.
No início do mês de março são aprovadas duas medidas, no valor de mais de 900 milhões de euros, para apoio ao arrendamento e ao crédito/habitação, e o país conhece en ce moment os mais recentes auxílios e que valem mais de 2,5 mil milhões de euros.
IVA 0% nos produtos essenciais e com uma descida igual no preço dos bens a suportar pelos comerciantes, o que equivale a 12% de redução a partir de abril; aumento de 1% dos salários dos servidores públicos e a subida para €6 do subsídio de refeição; mais 30 euros para as famílias frágeis e 15 euros por cada filho, abrangendo mais de um milhão de pessoas. Tudo somado aos apoios de abril, julho, setembro e dezembro.
Uma luminária da Iniciativa Liberal, com os apelidos Oliveira Pinto, mussitou que Costa andou tarde quanto ao IVA 0%. Pinto gostaria de ver Portugal a aprovar medidas nos impostos que tivessem o duplo efeito – redução da receita do Estado e não reflexo no preço dos produtos. Não foi isso que foi feito para bem do país. O acordo tripartido, agora assinado, obriga claramente a produção e a distribuição e permitirá avaliar, com base nos dados que viermos a encontrar, quem terá andado, nos últimos meses, a viver à grande com a subida dos preços.
Se querem comparar façam o favor. Não encontrarão melhor, por essa Europa, sob o ponto de vista do equilíbrio e dos universos que se quiseram e querem defender perante as exigências graves do tempo que vivemos.