Nos últimos tempos os desígnios políticos do país têm andado em polvorosa, com muito a ser dito sobre Orçamento do Estado, eleições antecipadas, “geringonça”, crise e outras coisas que tais, muitas delas já muito desviadas do que realmente se passou, num jogo de fantoches que distraem do que realmente vai acontecendo.
O próprio jogo das culpas vai sendo feito através da moldagem da realidade, das emoções e das percepções, mas há coisas que não enganam, são como o algodão:
● A dita ‘Geringonça” terminou em 2019 quando o PS não quis assumir um acordo escrito.
● O Bloco de Esquerda não votou favoravelmente nenhum orçamento desta legislatura, tendo já votado contra o Orçamento do Estado para 2021.
● Eleições antecipadas não são uma fatalidade, ou a única saída para o impasse de ter um Orçamento do Estado chumbado, são uma escolha do Presidente da República, que de resto tem contribuindo para uma excessiva dramatização do que, na verdade, são mecanismos democráticos em ação.
● No processo negocial o Bloco apresentou 9 medidas concretas, muitas delas já defendidas anteriormente pelo mesmo PS que agora escolheu não incluir nenhuma delas na proposta de Orçamento do Estado para 2022. Pelo contrário, para algumas das 9 medidas simulou respostas remetidas para 2024 e 2025, anos obrigatoriamente de uma nova legislatura.
De resto, a execução de um orçamento que continua a cristalizar a presença da Troika na legislação laboral iria, a seu tempo, deixar muito claro qual o “lado certo da história” e passemos adiante…
Porque enquanto nos distraímos com os episódios de uma alegada crise política e com o reality show “A vida de Marcelo, um homem comum”, outras coisas foram acontecendo. Coisas essas que podem ter consequências estruturais que se prolongam no tempo, além dos próprios efeitos do chumbo do Orçamento do Estado para 2022.
No dia 28 de outubro, um dia apenas após a votação na generalidade do Orçamento, foram assinados 14 contratos de concessão de direitos de pesquisa, prospecção ou exploração mineira. Contratos esses assinados sem que nenhum Estudo de Impacto Ambiental seja ainda conhecido e à revelia daquela que tem sido a vontade das populações.
Refiro a Argemela e o Barroso pelo exemplo que têm sido de mobilização cívica, com a população, persistentemente, a demonstrar que não quer exploração mineira nos seus territórios. Ainda assim, no prazo de dois anos, com o Estudo de Impacto Ambiental favorável, a exploração avançará, pois o Governo PS já abriu a porta para tal, com a assinatura dos contratos de concessão.
Mas o futuro não está, ainda, escrito!
As comunidades Zapatistas, de raiz maia, são formadas por pessoas camponesas e indígenas e desenvolveram, ao longo dos últimos 30 anos, um sistema de auto-governo no Sul do México. As Zapatistas estarão brevemente em Portugal, em São Pedro do Sul e no Barroso, para escutar e para ser a voz, com quem teremos muito a aprender, que lembra que a Natureza está perto do seu fim.
Enquanto o Governo parece fazer gosto em nos dirigir para uma recreação do bacoquismo narrado por Aquilino Ribeiro na sua obra Volfrâmio, termino com palavras das Zapatistas, para quem é claro quem está a matar a Natureza: “é o capitalismo. É o capitalismo que está a destruir a vida da natureza” e apenas a construção de alternativas ao capitalismo nos poderá dar, “enquanto Humanidade, alguma possibilidade de sobrevivência”.