Desigualdade económica

Gilles Lipovetsky e Jean Serroy, no livro “A Cultura-Mundo: Resposta a uma sociedade desorientada”, analisam o que consideram ser uma cultura pós – revolucionária e hipercapitalista. Os autores constatam que o que “triunfa e se difunde em todo o lado é o imaginário da competição, a cultura do mercado, que redefinem os domínios da vida […]

  • 9:47 | Terça-feira, 04 de Março de 2014
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Gilles Lipovetsky e Jean Serroy, no livro A Cultura-Mundo: Resposta a uma sociedade desorientada, analisam o que consideram ser uma cultura pós – revolucionária e hipercapitalista. Os autores constatam que o que triunfa e se difunde em todo o lado é o imaginário da competição, a cultura do mercado, que redefinem os domínios da vida social e cultural.

Upton Sinclair considera que estamos a ser vítimas de uma ofensiva dos plutocratas e considera que “é difícil conseguir que um homem entenda algo, quando o seu salário depende de que não o entenda. Na verdade, vigora o mito do ricos que merecem sê-lo em contraste com a pobreza que, na sua essência,  será a consequência dos problemas de personalidade dos pobres.

No ano 2000 reuniram-se 189 chefes de estado, nas Nações Unidas, em Nova Iorque e assinaram a Declaração do Milénio. O documento plasmou objetivos e estratégias para reduzir a pobreza, a fome, a mortalidade infantil e a discriminação contra as mulheres. Houve, de fato, progressos assinaláveis, 500 milhões de pessoas saíram da miséria, a mortalidade infantil caiu 30%, a morte por malária diminui 25% e aumentou o número de pessoas com acesso a água potável.


Se os progressos elencados merecem a nossa admiração, há uma novidade que nos merece muita atenção. A desigualdade económica, um problema característico dos países menos desenvolvidos, tornou-se comum também nos países mais ricos. A diferença entre os rendimentos de 1% dos mais ricos e o resto da população chegou à maior amplitude desde 1920. 90% da riqueza total do planeta permanece nas mãos de apenas 1% dos seus habitantes. Joseph Stiglitz recordou que o subsídio europeu concedido por vaca é igual aos dois dólares diários com que subsistem milhões de pobres.

Assistimos à rápida disseminação da miséria (pobreza, desintegração das famílias e comunidades, enfraquecimento dos laços humanos até à sua transformação no que Thomas Carlyle denominou nexo do dinheiro`. (Zygmunt Bauman, Danos Colaterales: desigualdades sociales en la era digital, 2011).

Portugal permanece como um dos países “mais desiguais da União Europeia”, segundo o estudo “Desigualdade Económica em Portugal”, realizado pelo Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG) para a Fundação Manuel dos Santos. Ter trabalho já não garante uma vida digna. Assistimos, dia após dia, à debilidade e empobrecimento da classe trabalhadora. O modelo europeu de bem estar parece estar em perigo e há quem o considere obsoleto. Zygmunt Bauman  defende que o ‘poder’ ultrapassou a política e a política foi despojada de poder, ocorreu o divórcio entre o poder e a política.” Os negócios, os especuladores e os mercados são o novo “evangelho”, relegando a política  para um plano secundário. Paralelamente, assistimos à despolitização das massas que assistem ao desaparecimento da “proeminência do político” e ao triunfo do “hipercapitalismo”. O sucesso está intimamente ligado à fortuna e aos mercados. A capacidade económica sobrepõe-se a quaisquer valores ou ideologias. O cartonista do Público, Luís Afonso, a propósito da atribuição de 471 Vistos Gold em Portugal a investidores, coloca as suas personagens a dialogar: “- São recomendáveis?; – Claro. Há milhares de euros a recomendá-los.” E o que dizer das posições do ministro Rui Machete sobre a Guiné Equatorial, no que concerne ao processo de adesão à Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP)? Obiang foi eleito pela revista Forbes o oitavo governante mais rico do mundo, apesar do seu país ser considerado um dos mais pobres do mundo. Um bom exemplo do mundo de hoje, “enriquecerá” a CPLP enquanto, por cá, poderá contribuir para a recapitalização do BANIF, através da Sonagas, com 130 milhões de euros, arriscando-se a assumir de 11% a 15% do capital da instituição, uma percentagem superior à da família Roque. Tudo tem um preço…

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Publicado em Opinião