Todos necessitamos de cuidados, durante o percurso de vida, provavelmente, em vários e diferentes momentos. É muito provável que tenhamos também que prestar cuidados a um ente querido. Poucos de nós estarão preparados, se e quando surgir a necessidade de cuidar. Pergunto-me, muitas vezes: Como será? Como reagirei? Que qualidades e defeitos terei? Que opções tomarei? Estarei à altura do desafio? Serei um bom cuidador? Que recursos e apoios teremos?
Este é um assunto que diz respeito a todos. Sim, há muitas portuguesas e portugueses que cuidam de um descendente doente e dependente, do pai, da mãe do irmão…. Transformam a sua existência no apoio ao mais frágil. Deixam tudo, muito ou pouco, para trás, para se dedicarem, em pleno, ao ato de cuidar, um ato de amor, não isento de dor. Aceitam a invisibilidade para cuidar e lutar contra as adversidades, muitas vezes na solidão e isolamento, numa infinita generosidade.
Cuidar de quem cuida informalmente, em regra familiares, apesar dos avanços que resultaram do Estatuto do Cuidar Informal, enquanto medida de política social, continua a ser um desafio por resolver. A jornalista Sara Dias Oliveira publicou um excelente trabalho na Notícias Magazine: “Quando os cuidadores vão de férias”. As famílias entrevistadas falam em descanso, não em férias. Não há verdadeiramente férias para quem cuida a tempo inteiro. São milhares as pessoas que decidem cuidar e que o fazem, desde que as forças e os recursos assim o permitam: “Só se não puder, só se não tiver forças nos braços, sempre disse que os meus pais nunca iriam para um lar”, confessa Fátima Coelho, que também olhou pelo pai nos últimos momentos da sua vida. “Não tenho isto como um fardo, cuido da minha mãe de vontade e de coração.” (Notícias Magazine, 23 de junho de 2024)
No recente estudo “Saúde Mental e Bem-Estar nos Cuidadores Informais em Portugal”, do Movimento Cuidar dos Cuidadores Informais, fica evidenciado, por exemplo, que os “Cuidadores portugueses precisam urgentemente de apoio psicológico”:
“A maioria dos cuidadores informais, mais precisamente 83%, já se encontrou num estado de burnout, de exaustão emocional. E 78%, ou seja, quase oito em cada dez cuidadores, admitem ter sentido necessidade de apoio psicológico, em algum momento da sua vida.”
A Comissão de Acompanhamento, Monitorização e Avaliação do Estatuto do Cuidador Informal (CAMECI) publicou, no dia 06 de junho de 2024, o relatório que analisa os principais indicadores disponíveis. Ficam evidenciados avanços, mas também algumas lacunas e limitações. Dos 33.651 requerimentos de ECI, foram indeferidos 12.009 (36%); dos 22.255 requerimentos de Subsídios, foram indeferidos 14.145 (64%). Havendo, certamente, razões que justifiquem tão elevado número de indeferimentos, não podemos despreocupar-nos, bem como com a baixa taxa de pedidos, face ao número de cuidadores informais existentes no nosso país. A divulgação da medida e a desburocratização do processo são indispensáveis para que mais famílias sejam apoiadas. O valor médio atribuído, em caso de deferimento do requerimento de subsídio, é de 309,33€.
Das recomendações da CAMECI, que devem fazer o seu caminho, no sentido de progredir na promoção de uma vida digna, destaco a seguinte: “Harmonizar o subsídio a nível do salário mínimo nacional e aumentar os critérios de elegibilidade.”
Sem a concretização do objetivo – CUIDADOR INFORMAL COM DIREITO AO SALÁRIO MÍNIMO NACIONAL – será impossível, na esmagadora maioria dos casos, garantir dignidade e humanidade à pessoa cuidada e ao seu cuidador.