“A coragem dos medrosos é como a luz das velas. Ilumina pouco porque treme muito.” – Provérbio popular.
Desmobilizar os ânimos daqueles que defendem outro rumo, os chamados dissidentes, parece ser hoje uma das linhas orientadoras do partido de André Ventura.
Porém, até aqui, tal acontecia de dentro para fora em centrifugação contínua perante todos os pretextos, e são imensos, proporcionados pelos regentes governantes, mas ao que se vê, tal acontece também no âmago mais profundo do partido, onde as polémicas se sucedem, se tentam silenciar, ao invés das outras, estrepitosamente difundidas, antes se cingindo a um bizarro teatro de sombras entre os acérrimos apoiantes de Ventura e os seus oponentes, dissidentes, adversários ou o que lhe queiramos chamar. Estes, têm vindo a ser sucessivamente silenciados, expulsos e desmobilizados de toda a eventual linha pluralista e democrática do partido.
Fernanda Marques Lopes, fundadora do Chega, deu até entrada de um requerimento visando impugnar o Conselho Nacional, “Reconheço que muitos perderam já a paciência e afastaram-se, alguns mesmo tendo optado pela desfiliação” e acrescentou “Temo que, com esta postura autoritária, André Ventura vá dando razão aos que clamam pela ilegalização do partido, porquanto não pode haver partido sem democracia, pluralismo…”
Por seu turno, o ex-braço-direito Nuno Afonso, refere que o líder “não gosta de se sujeitar a escrutínio”, mais afirmando “André Ventura é a imagem do sistema político que diz combater, o despesismo com as contas, a oferta de cargos aos que lhe convêm, a balbúrdia jurídica em que envolve o partido e o empurrar com a barriga os processos judiciais, a perseguição dos adversários políticos” concluindo que Ventura toma decisões “mesmo que irregulares e mesmo sabendo que haverá impugnações e outros acórdãos do Tribunal de Contas a dizer que não pode fazer o que lhe apetece, porque o que quer é que os que pensam pelas próprias cabeças acabem por se afastar…” e assim “arrisca-se a ficar sem partido porque a PGR e o TC não vão permitir autoritarismos internos e ainda menos no país.”
Ventura obteve unanimismo em todas as listas por ele apoiadas na eleição dos delegados que estarão presentes na próxima Convenção do partido, no final deste mês, e que irão ter o direito a votar para a próxima liderança.
A título de mero exemplo, em Lisboa, Ventura obteve 99,1% de votos na lista que apoiou, numa incontestável vitória estilo “norte coreana”.
Há hoje quem afirme que Ventura blindou o partido para conter candidaturas contra a sua liderança, o que é estranho face à auto-confiança recorrentemente apresentada e perante a segurança de quem está para durar, de pedra e cal firmado.
Talvez sejam factos deste teor que levam Fernanda Marques Lopes a falar em “alteração das regras ad hoc, conforme são mais convenientes…” o que é tanto mais estranho quanto, no dizer de Nuno Afonso, o líder “não só domina as distritais |porque as pode exonerar| como domina a máquina interna do partido.”
A dar voz a todos estes “incidentes”, Ventura, “malgré tout” aparenta temer a democracia interna que pode dar voz aos seus adversários e, assim, pôr em causa a sua liderança. Ainda assim, e com um contexto tão amplo de aparentes consensos, será que, de facto, Ventura manda no partido?
Em Viseu, ao que apurámos, também a dissidência existe e se mantém presente, apesar dos tiques autoritários do presidente da comissão política distrital, João Tilly. O mesmo que acumula, ao que dizem irregularmente, com o cargo de presidente do Conselho Nacional, apesar dos estatutos vigentes (2019) referirem que ninguém possa ocupar dentro do partido, em simultâneo, dois cargos electivos ou de nomeação.
Nesta cidade, um grupo de militantes enviou em Dezembro passado uma carta à Comissão de Jurisdição do Chega através da qual impugna as eleições para os órgãos distritais, ocorridas a 2 de outubro e solicita a sua repetição, exigindo que estas, ao invés das anteriores sejam livres de pressões e sem “arruaças, acusações soezes e injúrias”, requerendo ainda esclarecimentos sobre a constituição da delegação de militantes do Chega de Viseu para o Congresso ou Convenção.
Provavelmente vão ter que esperar sentados, porque enquanto a resposta Chega e não Chega, escoar-se-á qualquer efeito prático perante a realização da 5ª Convenção, que decorrerá em Santarém, a 27, 28 e 29 deste mês de Janeiro.
(Fotos DR)