Bem-vindo, Papa Francisco!

Os bons políticos são aqueles que, sendo crentes ou não, conseguem entender que Portugal tem uma matriz cristã, aqui vivem mais de 80% de pessoas que, quando questionados sobre a sua confissão, se afirmam católicos.

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  • 11:25 | Sexta-feira, 03 de Fevereiro de 2023
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Neste país, que parece não saber o que quer, basta um erro de Carlos Moedas, para se questionar a vinda do Papa Francisco e o grande momento que serão as Jornadas Mundiais da Juventude (JMJ).

Numa única semana, em agosto, Portugal acolherá mais de um milhão e meio de jovens. Virão de todas as partes do mundo e levarão do nosso país o que nós quisermos que levem. Pela minha parte, o que eu gostaria que ficasse na memória de todos eles seria a referência a um sítio na Europa que se apresenta seguro, integrador, saudável. Um território onde fosse fácil constatar que se vive com dignidade, com civilidade, com cultura. Uma nação que se mostra sem conflitos de qualquer natureza, que aceita a forma de estar e de ser do outro, sem menorizar.

Um palco provocou uma comoção nacional. Não tenho para mim que quatro milhões de euros seja muito dinheiro para o local principal dessas jornadas, mas já tenho muitas dúvidas sobre os dois milhões para o palco secundário onde Manuel Clemente rezará missa – o do Parque Eduardo VII. O grande problema do palco do Tejo é mesmo não se saber se há mesmo uma ideia para o futuro. E pelas palavras de Moedas ninguém ficou esclarecido.

As JMJ são uma organização da Igreja Católica. E por essa razão não pararam as reivindicações de que o Estado laico não deveria envolver-se num evento de natureza religiosa. O Estado laico não é o que nega a importância das religiões, é o que lhes dá o devido relevo e as enquadra enquanto elementos essenciais da vida social e cultural de um povo.


O Estado e as autarquias locais, devem responder positivamente perante as solicitações de cada confissão religiosa e isso tem sido feito de forma ampla.

A Igreja Católica tem uma relevância única no mundo. Tem enquanto movimento religioso, mas, também, enquanto elemento importante no contexto da política internacional. E esse papel não poderá, não deverá, ser esquecido em tempo algum.

Será aconselhável que se analisem as visitas de Francisco, de Bento ou de João Paulo ao longo do último meio século. Elas foram essenciais para a abertura política, cultural e social de muitos países. As últimas viagens de Francisco, em territórios onde o catolicismo tem um posição residual, tiveram das autoridades políticas o máximo investimento, um relevo institucional muito significativo. Afinal, Francisco e a Igreja Católica são das poucas vozes respeitadas em todas as chancelarias.

 

Mas os bons políticos não são aqueles que obrigam os portugueses a engolir laicismo pela goela abaixo. Os bons políticos são aqueles que, sendo crentes ou não, conseguem entender que Portugal tem uma matriz cristã, aqui vivem mais de 80% de pessoas que, quando questionados sobre a sua confissão, se afirmam católicos.

Ora, essa realidade compromete as políticas e obriga os governos de todos os escalões. É por isso que não me parece muito significativo o investimento que todas as entidades públicas vão fazer. Em boa verdade, será menos de 20€ por cada português católico, um valor modesto para tão grande momento de afirmação da nossa realidade hodierna e da nossa presença no mundo.

É também neste encalço que alguns reivindicam a obrigação constitucional da separação entre igrejas e Estado. Não é de hoje essa discussão, ela atravessou o tempo primeiro do regime liberal e, depois, a república inicial. Há, contudo, uma questão que interessa ter presente – Francisco não é só um líder religioso, é, também, um chefe de Estado.

Sei bem que, no seu íntimo, muitos gostariam de fazer desaparecer a Concordata, eliminar toda a Igreja do universo social e solidário, de impedir que os equipamentos dos corpos de bombeiros sejam benzidos por um qualquer cura. Mas o país é o que é e devemos entendê-lo e respeitá-lo.

O que importa, agora que o tema vai começar a deixar de ser pertinente para a imprensa e já fez um dano relevante à organização, é que se faça tudo bem. Mesmo que todos saibamos que no dia em que o Papa estiver a chegar a Portugal ainda estarão os pintores da Mota-Engil a dar os últimos retoques no tal palco maldito.

Depois da sua ida, o altar deixará de ter a Santa Cruz e podem a ele subir todas as Madonnas deste mundo. Que a edilidade lisboeta saiba dar-lhe bom uso.

 

Ascenso Simões

(Fotos DR)

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Publicado em Opinião