Ainda as eleições

Manda o tino que não se desvalorize a votação que obteve. Não se ganha nada em atacar o Chega! nos palanques e nas tribunas. Muito menos, pedindo a sua ilegalização. Isso não é nada, e para o Ventura é canja. Isso é como querer ganhar na secretaria o que se perde no campo.

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  • 15:13 | Sexta-feira, 05 de Fevereiro de 2021
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Logo a seguir às eleições presidenciais, senti que houve gente responsável que não interpretou bem os resultados.

Por alguma coisa, os movimentos populistas grassam pela Europa fora. Não são como os míscaros, não são de geração espontânea. Nascem porque há um território político, que está vago, mercê de um descontentamento social que encontra acoito nesses partidos, esperançando que eles respondam ao que a democracia não lhes deu. Displicentemente, amiúde. A maioria não quer saber de ideologias e de filosofias para nada. A maioria quer é pão em cima da mesa e guito para pagar a luz e o gás. O resto são tretas.

Não sou militante do “Chega”. Nem faço a sua defesa. Falo só do que me parece prudente. E rasgo as vestes quando vejo notáveis políticos a pedir a ilegalização do “Chega!”.


Manda o tino que não se desvalorize a votação que obteve. Não se ganha nada em atacar o Chega! nos palanques e nas tribunas. Muito menos, pedindo a sua ilegalização. Isso não é nada, e para o Ventura é canja. Isso é como querer ganhar na secretaria o que se perde no campo.

Combata-se, retirando-lhe a razão das suas queixas e argumentos. Combata-se, acabando com o imobilismo, o comodismo, o aparelhismo. Combata-se, acabando com as coutadas e os feudos, as benesses e as prendas. As medalhas e as comendas. Se meio milhão de portugueses votou no seu líder é porque ele lhes dá uma esperança.

Esperança que vem de, após quase meio século de democracia:

• continuar a grassar a corrupção;

• continuar a injecção de dinheiros públicos nos bancos;

• condecorarem-se gestores exemplares, depois arguidos e condenados, assim se ofendendo Camões;

• não haver renovação dos agentes políticos;

• perpetuarem-se em lugares de relevo dinossauros, enriquecendo o parque jurássico em que o país político se transformou;

• haver a percepção pública de que os políticos são uma classe de intocáveis;

• medrarem os concursos públicos feitos à medida dos fiéis;

• processos judiciais de tubarões, de que não se vê fim à vista e outros quase em vias de prescrição;

• haver um Estado que não fiscaliza apoios sociais nem pune;

• haver sinais de nepotismo declarado, mas que fica impune;

• haver pensões de sobrevivência de miseráveis 3 centenas de euros;

• os partidos políticos gozarem de isenções fiscais, para além dos apoios que já recebem;

• o interior estar cada vez mais pobre, sem ver meios de melhorar;

• não haver uma regulação nas remunerações nos dirigentes da Administração, empresas e institutos públicos;

• não ter havido um investimento sólido em recursos humanos e equipamentos, no SNS;

• o país não estar preparado para catástrofes naturais e tecnológicas;

• não haver planeamento, e tudo, ou quase tudo, se fazer de improviso;

• continuar a investir-se em projectos megalómanos, desaprendendo com os erros do passado;

• confundir- se democracia com ausência de autoridade e comedimento nas palavras com censura;

• as filas de espera para as consultas, que duram anos;

• facilitar-se na exigência e no rigor, seja no que for.

Muito se fez em Portugal, depois de 1974. Mas meio século é muito tempo para que tanta coisa continue na mesma.

Se o leitor conseguiu ler até ao fim, gabo-lhe a paciência e agradeço-lhe o interesse.

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Publicado em Opinião