A bola de carne e o bolo de azeite

Se a União Europeia não serve para dar respostas conjuntas a problemas comuns, não serve para nada!

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  • 19:02 | Domingo, 29 de Março de 2020
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Há uns anos, no pico da crise das dívidas soberanas, um tal de Dijsselbloem, holandês de nascimento, apontou o dedo aos países do sul da Europa, acusando-os de gastarem o dinheiro em “copos e mulheres” e “depois pedirem que os ajudem”.

Generosos, digamos que foi um sermão ordinário e de mau gosto, indigna de um governante.

A “coisa”, prenunciadora de divergências profundas, resolveu-se no correio diplomático, com alguns melindres pelo meio. Mas o vírus do preconceito ficou lá, impertinente e vivo.


Na passada semana, repetiram-se os tiques de sobranceria, estribados em não se sabe bem o quê, com o ministro holandês das finanças a discordar da emissão de uma dívida conjunta, a alvitrar uma investigação às contas de Espanha, que se mostra incapaz de, por si, recuperar economicamente, depois de curar os enfermos e enterrar os mortos que não param de aumentar. E, pasme-se, a criticar Itália por, no pico da crise, estar a internar os mais velhos.

Porventura, no seu país, empurrados por moinhos de vento, atirá-los-ia aos diques, embrulhados em tulipas.

Esta inflexibilidade é a prova de que no mesmo espaço coexistem países que põem em 1º lugar a saúde das pessoas e outros que cuidam da saúde das economias. Esquecendo que estas não existem sem aquelas.

Mas demonstra também o que significa a solidariedade para países ricos com fracos políticos.

Se a UE não servir para dar respostas conjuntas a esta crise simétrica, de ordem sanitária, social, económica e financeira, para que servirá, então? Para o controlo dos défices, para a disciplina orçamental? É muito, mas é pouco.

A Itália, que, inicialmente, apenas contou com a ajuda da Rússia, China e Cuba, deu 15 dias ao Eurogrupo para encontrar respostas, sob pena de, se tal não acontecer, resolver as coisas por si.

Por tudo isto, no fim do último Conselho Europeu, que terminou com um acordo pífio, com sabor a “poucochinho”, o PM português classificou a atitude holandesa como “repugnante”, “inaceitável”, exemplo de “mesquinhez” e “inconsciência”, acabando por fazer o funeral à organização se nesse trilho persistir.

Torço para que não seja uma entrada de leão a anteceder uma saída de sendeiro.

De facto, a UE dá mostras de não ter consistência, falta-lhe o cimento do interesse mútuo, o sentido da pura entreajuda. Já tremelicou, várias vezes. A continuar assim, vai colapsar ou continuar a diferentes velocidades, pondo em causa a sua matriz fundadora, a convergência económica e a coesão social.

Se a UE não serve para dar respostas conjuntas a problemas comuns, não serve para nada!

Sempre o admiti, não por ter informações divinas ou conhecimentos superiores.

Apenas e tão só porque usar a mesma farinha para fazer bolas de carne e bolos de azeite, só prejudica o queijo da serra.

E o que aí não virá de crises políticas e subidas exponenciais dos populismos…

Mas, em sã consciência, teremos feito alguma coisa séria para os evitar?

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Publicado em Opinião