“Porque a mutação metafísica operada pela ciência moderna traz na sua esteira a individuação, a vaidade, o ódio e o desejo. Em si o desejo – ao contrário do prazer – é fonte de sofrimento, de ódio, de infelicidade.”
Michel Houellebecq, “As Partículas Elementares”, (Relógio D’Água, 2013)
O homem da Idade Média olha o mundo de olhos em alvo, para o Céu virados.
O homem do Renascimento olha para o mundo com os olhos no espelho, descobrindo-se e atónito com a sua grandeza.
O homem Romântico fecha os olhos, recusa a realidade exterior circundante, implode o olhar. Olha para dentro de si.
O homem do Realismo olha o mundo incansavelmente, absorvendo o mais ínfimo pormenor, tentando captar tudo o que o rodeia. Zola para escrever “Germinal” não foi anonimamente trabalhar como mineiro durante meses para saber construir com verosimilhança a intriga?
O homem do século XX, numa síntese atarantada, olha o mundo de todas as atrás referidas formas, não se decide por nenhuma, e fica incrédulo com aquilo que a comunicação social lhe vai servindo adequadamente aos interesses tribais, em enfoques que lhe são dados por 3ª pessoa, visões do mundo numa polidiversidade de Um Admirável (?) Mundo Novo (?).
O homem de hoje, como o homem do Renascimento, mas sem motivo algum, olha para o mundo através da sua imagem, já não ao espelho, mas sim através das “selfies” tiradas com os venerados telemóveis, numa vã tentativa de gravar, perdurar e transcender o efémero da sua curta existência. A sua individuação do tamanho de um átomo…
Passámos de um tempo de espiritualidade e fé para um tempo de racionalidade e descrença onde o “eu” tenta a inglória façanha de se sacralizar. Não pela obra e grandeza, mas pela vulgaridade, empáfia, decadência, ilusão e bárbara vaidade.
Em breve, perante o cataclismo exterior, voltará a fechar os olhos e a implodir o olhar. Pode ser que ainda consiga avistar alguma coisa de aproveitável…!