Morrer é interromper. Interrompemos tantos actos, vida fora. Até à final interrupção. A do não-retorno.
Vergílio Ferreira finou-se a escrever uma das suas cartas a “Sandra”, a sua já falecida mulher. Tê-lo-á ela chamado. Aqui, ficcionou-se como “Paulo“. Uma coincidência.
A rádio transmite um programa intitulado “Última Sessão”. Interessante re-coincidência.
A morte é um instante épico. Nunca assistimos à nossa morte. Somos o sujeito e o objecto dessa derradeira acção. Uma isopatia (talvez um exacerbamento do pathos?) inenarrável.
O homem que escreve sobre a morte, que fotografa a morte, que esculpe a morte, que compõe um requiem é um ficcionista. Um congeminador/espectador da morte.
Por vezes, até e somente um relator/esteta. Ou um desenfreado Caronte, como quantos hoje degolam suas vítimas ajoelhadas (num derradeiro perdão de quê ou prece a quem?) ou lhes pregam um tiro na nuca exposta, enquanto um outro carrasco filma ou fotografa.
Fantástico poder da imagem que nenhum texto iguala, nenhuma descrição retém, nenhuma narração contém.
A narrativa da morte é um paroxismo retórico. Desconexo. Insentido. O narrador não é o que morre. É o que vê morrer.
(Fotos DR)