“Nenhum de nós tinha a mais pálida ideia sobre a fundição de metais, o fabrico de peças, a síntese de matérias plásticas, etc. Já para não falar de coisas mais recentes, como as fibras ópticas e os microprocessadores. Vivíamos num mundo formado por objectos cujo fabrico e manutenção nos eram inteiramente estranhos.”
Houellebcq, M. “Plataforma”, 2021
Esta reflexão de Houllebecq, o controverso escritor francês associado à extrema-direita (o que em nada nos impede de o ler, pois não usamos antolhos), é paradigmática da evolução (?) humana.
O homem que, perante as realidade do seu quotidiano e as necessidades daí decorrentes, no contacto directo com as matérias, forjava o material para as trabalhar e conseguia o produto final, saído de suas mãos, que dava resposta às ferramentas da sua sobrevivência, a roda, o machado de sílex, o ferro… passou ao homem que precisa de tudo, mesmo do que nunca usa ou usará, o tudo que lhe é vendido num acto cúmplice de consumismo acatado, o homem-acumulador que aceita que outros destruam maciçamente para lhe construírem os adereços acessórios e dispensáveis, ignorando de que se compõem, quantos florestas se destruíram para o obter, quantos animais foram extintos para o ter.
Ademais, na sua insciente consciência ( o que quer que tal seja…) manifesta-se cronicamente contra os ecocidas, conta os poluidores, contra os “arrasadores” de um planeta para dar resposta à ganância e à ávida sociedade do “tem-tem”.
O ter superou o fazer e está hoje ao alcance de um netclic e de um cartão de crédito.
O homem esqueceu as origens e tornou-se o alarve possidente ou até plutocrata da ignorância doirada. O homem de hoje já nem carece das mãos para trabalhar. Basta-lhe o indicador direito…
Por isso e para lembrar os esquecidos, no Museu Terras de Besteiro, em Tondela, no meio de uma bela sala de um rico palácio, os holofotes iluminam um arado, noutra o barro negro de Molelos…