Actualmente, um dos maiores déficits democráticos da “periquitagem” política por aí voejante – decorrente da sua insuficiente preparação, aleatório recrutamento e crónica “ansiedade ascensional” – reside na capacidade de se dizer quanto ao agudo biquinho ocorre, assim como na incapacidade de se confrontar a posteriori com os desarrazoados alardeados.
Talvez seja a síndrome do clã ou da tribo que os crê de tudo e de todos protegidos;
Talvez seja um psitacismo descontrolado, nas arengas de muito significante sem significado;
Talvez seja a insciência e/ou inconsciência que lhes mina o esconso “disco” neuronial;
Talvez seja, afinal, o complexo do alpinista, que determina chegar ao cume sem previamente testarem o pulmão para as grandes altitudes.
Andam por aí, recusam a verdade e a gravidade do que vão proferindo, arboram-se em vítimas – deturpadoras – quando confrontadas com a verdade factual, que raramente têm espinha dorsal para assumir e, cereja em cima do bolo, são detentores de uma retórica de “3 vinténs”, munindo-se em auto-defesa de adjectivos tonitruantes, pensando, os néscios, que por os usarem branqueiam os dislates proferidos.
Citar Roland Barthes para esta camarilha será mero desperdício, mas aí vai…
“A fala é irreversível, é essa a sua fatalidade. O que foi dito não se pode emendar, salvo se for aumentado: corrigir é, aqui, estranhamente acrescentar. Ao falar, nunca posso apagar, safar, anular; tudo o que posso fazer é dizer “anulo, apago, rectifico”, em suma, falar uma vez mais. A esta singular anulação por acrescentamento chamarei “engasgamento”. O engasgamento é uma mensagem duas vezes falhada: por um lado, compreende-se mal; mas, por outro, com esforço, apesar de tudo compreende-se. Ele não está verdadeiramente nem na língua nem fora dela: é um ruído de linguagem comparável à sequência de golpes pelos quais um motor dá a entender que está mal de saúde: é este precisamente o sentido da falha do motor, sinal sonoro de um revés que se perfila no funcionamento do objecto. O engasgamento (do motor ou do sujeito) é em suma um medo: tenho medo de que a máquina possa vir a parar.”
In “O Rumor da Língua”, edições 70, 1987.