E lá ia eu a subir por andurriais poeirentos e casquinudos, rés de brejos, torgos e tojais, quando topo ao virar do esconso carreiral, junto a um talefe assentado e com ar estranhado, alheado cidadão…
— “Salve-o Deus!”, lh’ atirei mansinho.
–“E a vomecê que não falte”, me retorquiu, após escrutinada mirada.
Pela virtude da saudação e rosto de olhar limpo nos apercebemos estar, um e outro, perante gente cristã. E vai daí, ao natural, quase meia hora de fina conversa ali fluiu, batidinha na lancha, como lagartixa ao sol.
— “Sua graça?, demandei ao finar do cordo debate sobre os tempos pelos plainos tão quêdos.
— “Silvano, para o servir…” e mudos ficámos.
— “Ó Sôr Silvano, posso tirar-lhe o retrato?”, perguntei-lhe opresso pelo silêncio longo.
Pensou três vezes e retorquiu, — “É para alguma obra malina?”
Lesto o conformei, — “Acha? É pra prantar no feicebuque…”
Nesta palra estávamos quando de manso se achegou, desviada da passagem, moçoila atrigueirada e núbil, pestanuda, de belo buço e sinal negro na bochecha, num saracoté dengue d’anca requebrada, substituída a tamanquinha pela contrafeita adidas branca: — “Se estivesse a chover já tinhais alado…” pespinetou meio amena e metediça.
Retorquiu-lhe o Silvano, que já devia conhecer a peça, — “Mal chegaste, sol poente!”
E pronto, ali ficámos silenciados, amigos como dois vetustos faunos que se encontram à boca do matagal.
Trocámos dois “passou-bens”, que um só parco seria e lá fomos, eu a findar a romaria, ele a recolher a leiteira do lenteiro…
Os dias no planalto da Nave, singelos, ora feros ora amistosos, asinhos correm que a noute tomba cedo.
Pena a taberna do Zévouga ficar arredada mais dum tiro de calabrina, pois à compita bem marchava o briol de um alvaroque sem negócio, só por louvor à serrania e aos já rareados silvanos.
(Ilustração de João Hogan, in “O Homem da Nave – Serranos, Caçadores e Fauna Vária”, Ed. Bertrand, 2017)