O assomo de indignação que acudiu ao país pensante é legítimo e fundamentado. Custa a ver jantares com muito copo e mais gáudio na Igreja de Santa Engrácia, também dita Panteão Nacional, que depois de significar templo dedicado ao conjunto dos deuses entre os antigos romanos, passou a querer dizer “monumento erigido para receber os restos mortais dos heróis e/ou cidadãos mais ilustres de uma nação”.
Eu próprio tive a “dita” de assistir in situ a uma dessas trasladações, a de Aquilino Ribeiro. O que muito me enalteceu e comoveu.
Ninguém gosta de ver profanado um espaço de sacralizada honra e devoção a quantos “por obras valerosas se vão da lei da morte libertando”.
Porém, parece que já todos olvidámos um tempo pior e bem próximo, aquele em que muito do nosso património foi vendido ao desbarato em leilões-de-quem-dá-mais. Quais vozes se ergueram?
Parece que já nos esquecemos de que há património público a cair aos bocados, por falta de verba para evitar a sua derrocada. Tenho presente que os carrilhões do Convento de Mafra estavam a usufruir do mecenato de um banco qualquer inglês, para não se esboroarem nas lages da calçada.
Parece que ninguém se lembra que se despediram funcionários, guias, técnicos de conservação e de restauro por invocada falta de verba para lhes pagar.
Parece que ninguém recorda não haver verbas sequer para trivial papel higiénico.
Um tipo estrangeiro das hightechs da web summit resolveu dar um jantar no Panteão Nacional. E parece que não foi o primeiro. Perante a consequente mediatização do acto, o presidente da República indignou-se. O primeiro-Ministro engasgou-se. O ministro da Cultura calou-se e… pasme-se, um ex-secretário de Estado da Cultura revoltou-se.
E todavia, se o redito repasto foi efeito lastimável, porque não acudirmos à causa?
Se a DGPC tivesse verbas suficientes para a gestão corrente, nomeadamente para despesas de manutenção e de conservação, teria que se sujeitar ao ultraje de assim se “prostituir”? Claro que não…
E se não houvesse legislação sobre a matéria lavrada, alguém com bom senso correria tal risco?
Geralmente, as pegas de cernelha, ou o encabrestar do touro pelo cernelheiro e pelo rabejador, só são feitas quando falha a pega de caras por excessivos derrotes, fúria do touro, tarde acudir dos sete forcados…
Desculpem-me a analogia, mas… por mais que digamos que a ignorância fica muito cara, a Cultura também tem custos. Ou não?
Ou apenas vale o “arrota pelintra e faz-te lorde“?
Os meus respeitos à directora do Panteão, Isabel Melo, que nada mais fez que cumprir o que a lei estipula. E quero crer que muito lhe terá custado tal observância…
Um pouco do muito que por aí se disse…