A “camisola” veste-se a dois

As entidades empregadoras deviam atentar nesta mudança e, também elas, “vestir a camisola”. Nem que fosse só um pouquinho e perceber, de uma vez por todas, que o seu sucesso depende em grande parte da satisfação dos seus colaboradores...

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  • 19:16 | Terça-feira, 13 de Setembro de 2022
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Há muito se ouve, em tanto que requisito para emprego, que o candidato deve, acima de tudo, “vestir a camisola”.

Esta expressão significa que a entidade empregadora passa a ser o “club” do empregado e que este deve por ele vibrar, dele ser fervoroso adepto, por ele dar tudo e mais uns trocos.

Este expressivo apelo devia ter a sua lógica. O emprego deveria ser a segunda ou até a primeira família do empregado e este, pela “família”, tal como pela “pátria”, deveria dar a sua devoção, o seu total empenhamento, a sua mais tenaz luta. Em segundo plano estaria, até, a vida pessoal e familiar.


Surgiu há relativamente pouco tempo, nos EUA, um movimento designado por “quiet quitting”, fundado na apodada “demissão silênciosa” e que consiste, essencialmente, em não fazer mais do que o estrictamente designado e fixado nos conteúdos funcionais de cada empregado, pondo de lado o conceito de “dar tudo pelo seu trabalho”.

Naturalmente que este conceito de “demissão silenciosa” não significa nada fazer durante o trabalho. Consiste sim em recusar horas suplementares não remuneradas, recusar responder a contactos da empresa fora do horário laboral e negar assumir responsabilidades para lá daquelas que são exigidas na função atribuída.

Este movimento, de acordo com inquéritos feitos, diz-nos que apenas 21% dos interrogados, a nível mundial, “vestem a camisola”. Na Europa, apenas 14% confessam fazê-lo, mas, por exemplo, em França, apenas 6% estão nesse patamar de comprometimento.

Este fenómeno revela, entre outras coisas, o cansaço perante um mundo laboral pouco recíproco, que pede muito mas dá pouco e esse pouco que dá sendo atribuído, com algum paternalismo e condescendência, como se de um favor se tratasse. Mas ainda mais, que os “empregados” mais jovens querem ter uma vida para viver para lá do trabalho e não abdicam de “desligar” da empresa para fruírem em plenitude das outras componentes vivenciais.

Vivem-se tempos de ruptura com novas mentalidades a recusar um conceito tradicional e assazmente dependente do mundo de trabalho.

As entidades empregadoras deviam atentar nesta mudança e, também elas, “vestir a camisola”. Nem que fosse só um pouquinho e perceber, de uma vez por todas, que o seu sucesso depende em grande parte da satisfação dos seus colaboradores e que, dar mais é receber mais, podendo pela sua recusa em percebê-lo a vir a ter, como em França, 94% de assalariados que se estão a “borrifar” para o patrão, com as graves consequências empresariais daí advenientes, a curto e a longo prazo.

 

(fotos DR)

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