O ANTIGO NATAL DA MINHA TERRA

  Ano após ano, mesmo que não queira, hei-de lembrar o antigo Natal da minha terra, a Sarzeda, a aldeia onde tive berço, pousa no mapa nas margens das Terras do Demo, aprendi mais tarde, mas no tempo da minha infância era ali o paraíso, havia todas as árvores de fruto e havia renques de […]

  • 17:36 | Segunda-feira, 28 de Dezembro de 2015
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Ano após ano, mesmo que não queira, hei-de lembrar o antigo Natal da minha terra, a Sarzeda, a aldeia onde tive berço, pousa no mapa nas margens das Terras do Demo, aprendi mais tarde, mas no tempo da minha infância era ali o paraíso, havia todas as árvores de fruto e havia renques de macieiras bordejando as quatro margens dos ribeiros da pequena quinta do meu pai, andavam por lá os bois lavrando em Primavera, e rebanhos, e jericos mansos e um passaredo que ninguém podia contar, e libelinhas, e cavalinhos d’El-Rei, e grilos, ralos e cigarras que se desafiavam a cantar quando, no céu, começavam a cair as estrelinhas-do-pastor.

Hei-de lembrar as minhas viagens pela aldeia, na véspera de Natal, ao entardecer, eu levava vinho em pucarinhos ou em garrafas de dois quartilhos às casas onde minha mãe me mandava e onde me diziam, em troca, para dizer à minha mãe que bem-haja. E hei-de lembrar esse pouso à lareira onde ardia o ritual cepo de carvalho, o bacalhau que então não me trazia mor prazer, filhós, maçãs assadas no borralho, o tio Chico que também vinha e a madrinha, o toque de rezar e, mais tarde, o sino num doido badalar, a geada depois caindo sobre o meu sono, não existia o Pai Natal e o Menino Jesus só o via de manhã deitado na miniatural manjedoura que as raparigas crescidas lhe construíam na igreja.


Desse presépio hei-de lembrar-me. Levantavam-no as tais raparigas sobre a mesa do altar da Senhora do Rosário, um montezinho de musgo, uma cabana armada como as dos pastores, caminhinhos de areia que vinham de uma longínqua montanha por onde cavalgavam as imponentes figuras dos três Reis, pastores e pastoras tinham chegado primeiro e deixavam cordeiros e cestinhos com pão e queijo, galinhas para o caldo da mãe do Menino, o pão e o queijo para S. José a quem o dono do curral traria de certeza, um púcaro com vinho. E a missa com o Menino que o senhor Padre nos dava a beijar e o tostãozinho colocado na bandeja e a saída, a correr, para o Adro e o resto da manhã e a tarde inteira toda para brincar.

 

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