“Bardinos” de ontem e de hoje

“Bardino” era um curioso nome que eu muitas vezes ouvi na minha infância. Dava-o o povo a alguns rapazolas que iam fazendo vida por ínvios caminhos que não os do rotineiro quotidiano, esse penar de sol a sol na lavra dos campos, sementeira, avara colheita, festivos dias também, que os havia, Natal ou Páscoa, S. […]

  • 21:13 | Sexta-feira, 24 de Junho de 2016
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“Bardino” era um curioso nome que eu muitas vezes ouvi na minha infância. Dava-o o povo a alguns rapazolas que iam fazendo vida por ínvios caminhos que não os do rotineiro quotidiano, esse penar de sol a sol na lavra dos campos, sementeira, avara colheita, festivos dias também, que os havia, Natal ou Páscoa, S. João ou festa do orago, vindima ou magusto de S. Martinho.

Bardino era quem alguma vez entrasse em propriedade alheia, quem não respeitasse pai nem mãe, quem entrasse no meloal, não para matar a sede com melancia madura que cortasse na ocasião mas apenas para destruir toda a produção que ali ficava, desprezível, inaproveitada sequer para a vianda do porco. Bardino era quem quebrasse os ramos largos de uma cerejeira, em Junho, em vez de saciar-se das cerejas que ficavam livres para pássaros ou passante que não tivesse cerejas suas no quintal.

Bardino chamava, às vezes, a mãe, o filho pequeno que se habituara a escapar da escola.


Na aldeia campesina, próxima da orca, diria Aquilino, em extremo, era assim, vai muito tempo. E era de crer, neste tempo novo de escola alargada, de democracia instalada, que a bardinagem se tivesse evolado, como se apagaram quase os caminhos da aldeia onde mal se colhem cerejas e onde já ninguém semeia melancias. As estradas romperam para a cidade. E os bardinos, travestidos, incendeiam agora os contentores, quebram candeeiros de Parque ou jardim, pintarolam granito de esmerada cor e lavor, dobram cercaduras que resguardam privacidades, quebram os bancos onde iria sentar-se um velho cansado ou um par de namorados.

E esta é ainda, quase só, uma bardinagem piedosa. Que há a outra, a dos pedófilos, a dos molestadores de cônjuges e de outros familiares, a dos assassinos, a dos que traem amizades, a dos que assaltam bancos nas horas mortas, os fora de lei e esses outros que os assaltam à clara luz, papéis assinados em festejados contratos.

Como eram inocentes os bardinos que assim ouvi chamar na minha infância!…

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