Parece que sim.
Faço o exercício de pensar no que estará na génese dos abusos de poder.
A Natureza humana? Uma infância de frustradas ambições, vendo os outros ter o brinquedo e o lugar ao sol?
Políticos e outros detentores das cadeiras de poder parecem embriagar-se quando sentem que podem.
Podem enganar, domesticar leis a seu favor, finalmente cumprir sonhos de vidinhas apagadas e sem brilho, ordenar à porta do seu automóvel que se torne, por passe de mágica, pesada, com o som abafado que só as portas dos carros muito muito caros têm, sobretudo se for aberta por motorista.
Podem finalmente ver o olhar de inveja dos outros, ser solicitados para isto e para aquilo. O favorzinho, a presença, a cunhazinha. E – oh céus! – como é embriagante a sensação de poder decidir a vida dos outros. Vê-los rondarem-nos, satisfazerem-nos caprichos, dizerem que sim com as cabecinhas em baloiço afirmativo, corroborando a certeza de sermos não só poderosos, como eternamente poderosos…
De repente existe-se.
E esta teoria dos desgraçados de pé descalço que finalmente têm poder servia-me tão bem para explicar a miséria que vejo na política portuguesa, quando o tio Ricardo, o malandro, vem estragar tudo.
Mais de 100 anos nas elites onde a Cultura, a Elegância, os Bons Modos e o afastamento das sórdidas fraquezas dos que nascem pobres e chafurdam na miséria até conseguirem furar na lambebotice partidária, no furo oportunista, na sorte de estar no lugar certo à hora certa, deviam garantir que a ganância estaria afastada.
Mas não.
Não há volta a dar.
Estamos cercados por todo o lado e pouco podemos. Não fora o que resta da chamada Comunicação Social – jangadas à deriva no mar cheio de tubarões neoliberais – e nem dávamos conta de episódios como o das subvenções vitalícias…
Só me ocorrem anseios de milícias cidadãs, grupos de pessoas que em vez de mira telescópica – que é capaz de dar cadeia – se ocupem nos próximos tempos de vigiar tudo e todos, todos a quem entregámos, nos últimos 40 anos, poder.