Que tal trocar de corpo?

O autor britânico, num contexto em que a clonagem e as técnicas de rejuvenescimento se foram tornando assuntos do quotidiano, procurou surpreender os leitores com a história de um novo Adão – “Um sexagenário escritor e dramaturgo que se vê diante da possibilidade de transplantar a sua mente experiente para um belo corpo de vinte e cinco anos. Os novos atributos físicos, porém, acabarão por metê-lo numa aventura perigosa.”

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  • 13:20 | Sexta-feira, 08 de Novembro de 2024
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Conversas conduzidas por Bernardo Mendonça com as mais variadas personagens que contam histórias maiores do que a vida. Ou tão simples como ela pode ser. Este é o “cartão de visita” do podcast do Expresso “A Beleza das Pequenas Coisas”, altamente recomendável.

No mais recente episódio, fiquei a conhecer melhor a atriz Benedita Pereira, Beny para os amigos. Frases fortes – “Não tolero a intolerância. As artes ajudam muito a pensar” e “A mãe das desigualdades é a de género. Ser feminista é ser antirracista, anti-homofobia, anti isso tudo” – servem de gancho para o que podemos escutar. Chamo a sua atenção para as questões relacionadas com a idade, um aspeto que tem “ainda mais impacto nas mulheres do showbiz.” Está nas salas de cinema o filme de terror “A substância”, escrito e dirigido por Coralie Fargeat e que tem como atriz principal Demi Moore que encarna a personagem de uma estrela do fitness que tenta fazer um pacto com a beleza e juventude eternas e, ao fazer 50 anos, decide trocar de corpo com uma jovem, tomando “A substância”.  A ditadura da juventude eterna é ainda mais dura com atrizes, apresentadoras, gente dos ecrãs.

O argumento do filme serviu de introito ao tópico da idade. Algumas ideias da Benedita: “As pessoas começam a mexer na cara tão cedo que parecem logo mais velhas.” / “Eu vejo a Nicole Kidman e tremo toda.” / “Enfim, é uma ditadura da beleza, da juventude.” / “Preocupa-me que, sendo nós influenciadoras, transmitamos ideias erradas.” / “Não há coisa mais bonita do que ver uma mulher com rugas e que está feliz, que está bem tratada, luminosa.” / “Eu trato-me, é super importante cuidarmo-nos. Nós queremos ser e estar bonitas, mas bonito não é só ser jovem.” / “Ainda não senti, em relação a mim, a pressão. Mas, vejo muita gente à minha volta obcecada e a fazer coisas. Às vezes coisas que não precisavam de fazer. Não havia necessidade…” / “Depois tens nas telenovelas mulheres de 40 anos a fazer de avós. Já não há lugar para os velhos?” / “Nos atores é giro, as rugas não são só minhas, também são das minhas personagens, do que sofri, do que me ri…acho isso muito bonito.”

Irei ver o filme no próximo fim-de-semana. Tenho alguma curiosidade, mesmo que o argumento não seja original, nem algo de absolutamente disruptivo como nos querem fazer crer. Há vinte e dois anos, o escritor Hanif Kuereishi publicou o livro “O Corpo e Outras Histórias” (Companhia da Letras) que começa assim:


“Ele disse: Escute, você diz que não ouve bem e sente dor nas costas. Seu corpo não vai parar de lembrar você dessa sua existência adoentada. Quer fazer alguma coisa a respeito?”

“Desta minha velha carcaça, já quase morta?”, perguntei.”

“Claro. Mas o quê?”

“Que tal trocar de corpo, ganhar um novo?”

O autor britânico, num contexto em que a clonagem e as técnicas de rejuvenescimento se foram tornando assuntos do quotidiano, procurou surpreender os leitores com a história de um novo Adão – “Um sexagenário escritor e dramaturgo que se vê diante da possibilidade de transplantar a sua mente experiente para um belo corpo de vinte e cinco anos. Os novos atributos físicos, porém, acabarão por metê-lo numa aventura perigosa.”

Este tópico deve merecer especiais cuidados numa sociedade que só vê a beleza na juventude e que parece não estar preparada para gerir o potencial e os riscos inerentes à inteligência artificial.

 

 

 

 

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Publicado em Opinião