1. Costa tem razão quanto ao combate à corrupção
Se há político, em Portugal, que tenha trabalhado intensamente para dotar as polícias e os tribunais das ferramentas necessárias ao combate à corrupção, esse político é António Costa.
Entre 1999 e 2002, enquanto ministro da Justiça, foram aprovados os primeiros diplomas que adequavam o Código Penal e o Código do Processo Penal aos normativos mais usados nos países europeus onde a perceção da corrupção sempre foi menor.
Enquanto ministro de Estado, tendo sido um dos pais do Simplex, Costa sempre teve como propósito a transparência pública e a redução significativa dos empecilhos que levavam à “propina”.
Na qualidade de Presidente da Câmara de Lisboa, foram muitas as iniciativas que visaram a perspicuidade dos processos e foram relevantes as mudanças nos regimes de contratação.
Como comentador, viria a concordar com muitas das propostas do Eng. João Cravinho, que fez da luta contra a corrupção o último combate da sua vida política ativa.
Costa sempre soube o trilho que importava fazer. Ele conhecia o insucesso que havia sido o mandato do Alto Comissário para a Corrupção criado em 1984 e sabia bem como viviam os partidos políticos antes da aprovação dos regimes públicos de subvenção.
Já como primeiro ministro, ainda no seu primeiro governo, foi elaborada a Estratégia de Combate à Corrupção que promoveu inovações legislativas e simplificações processuais, tendo aumentado consideravelmente os meios da Polícia Judiciária.
Os painéis internacionais conhecidos não avaliam a corrupção existente nos países, avaliam a perceção da corrupção por parte dos cidadãos. Ora, os casos que têm vindo a público em Portugal aumentaram a perceção de que há mais corrupção. A minha conclusão é exatamente a inversa – há mais combate, menos proteção dos grandes e pequenos poderosos, há mais atenção à grande e pequena negociata.
Claro está, o combate político não é feito unicamente de realidades, é feito de presunções e de deduções. O ataque a Costa e ao PS tem sempre um processo a bailar na cabeça de muita gente e nesse processo está José Sócrates.
Confesso que sempre me penalizou muito tal circunstância, como penaliza a muitos dirigentes do PS. Implicar Costa e os socialistas nos processos de Sócrates não faz sentido. Como não faz sentido que Sócrates queira implicar o PS nos seus processos, mesmo que muitos dos seus amigos e antigos colaboradores, entre os quais eu estou, se não limitem no cuidado e na exigência de um julgamento justo e rápido depois de um processo em tudo anormal.
Compete aos governos criar as leis, determinar as políticas de investigação criminal e dotar as magistraturas e as polícias de meios. Devem ser as polícias e as magistraturas a fazer o seu trabalho com profissionalismo e com diligência. Sem poupar quem tenha cometido crimes, sem escolher alvos preferenciais.
2. Costa tem razão quando identifica os problemas dos portugueses como propósito diário
Um governo estrutura-se em ministérios. Cada ministro deve fazer o seu trabalho tendo em conta as organizações públicas que de si dependem. Mas impõe-se ao líder da equipa, a cada tempo, uma atenção especial às urgências.
Tenho lido, cada vez com mais insistência, que o período que se vive no governo se assemelha ao fim do cavaquismo. E que haverá uma diferença – Cavaco tinha feito reformas e com Costa nem uma.
Quem me lê sabe das minhas críticas ao chefe do governo e aos ministros. Não me aquieto nunca no trabalho já feito e que, para mim, é sempre pouco. Mas comparar estes últimos oito anos com a governação de Cavaco é um pecado capital.
Prefiro que se fale de transformações. E nessas não se pode esquecer o caminho feito na energia, na ferrovia, no transporte público, na modernização do tecido produtivo, na simplificação administrativa ou na política de integração que os governos de Costa promoveram. Talvez falte mesmo medir e mostrar, propagandear.
Costa chegou ao governo depois dos anos de chumbo impostos pela Troika; iniciou um processo de recuperação lenta de rendimentos, de valorização do crescimento e de aumento do emprego. Veio a pandemia e mudou os planos; depois a guerra e voltou a mudar os planos. Em suma, em oito anos tivemos sempre um governo em contingência e disso não se podem esquecer os comentadores.
Importa que não se ande atrás de Costa com um falsómetro. Não podemos viver a nossa vida pública medindo as meias palavras, as falhas momentâneas. Obrigamo-nos a uma outra atitude crítica. Que todos façam o seu papel no fazer avançar Portugal, que o Polígrafo não cesse no encontro das verdades possíveis.
Ascenso Simões