Hoje já é certo que o misógino, egocêntrico e egoísta que o Partido Republicano americano decidiu escolher há 5 anos como seu candidato à presidência da República dos Estados Unidos da América do Norte perdeu as eleições que lhe permitiriam a sua reeleição no cargo. Dos estados decisivos que faltam apurar – Geórgia, Pensilvânia, Nevada e Arizona, todos se encaminham para uma vitória do seu opositor Joe Biden.
Nestas eleições diferentes de todas as outras, devido à COVID-19, os democratas instigaram os seus apoiantes a votar por correspondência (para evitar aglomerações em mesas de voto) enquanto os trumpistas, muitos negacionistas da pandemia, fizeram o contrário, apelando ao voto presencial nas mesas de voto.
Trump, ciente que estava há muito que a eleição seria apertada, ensaiou desde cedo uma narrativa de que os votos por correio seriam fraudulentos e ilegais. Ontem, à medida que esses votos por correspondência iam sendo contados, os últimos a serem-no, veio mais uma vez vitimizar-se dizendo que “era o vencedor dos votos legais”, dizendo-se roubado sem apresentar provas, pejando a sua verborreia de mentiras descaradas, de fake-news, para evitar reconhecer a derrota que sabe ter sofrido, em mais um acto ridículo de exibição de falta de nobreza e aptidão para presidir ao que quer que seja. Um berreiro desesperado e ilógico incendiando os ânimos em Phoenix e em todo o país.
Mas estas eleições foram igualmente uma espécie de referendo, não a Trump mas àquilo que hoje são os EUA, onde quase 70 milhões de eleitores insistiram em dar o mandato a um indivíduo que faria alguns ditadores corar de vergonha, que transformou a política num reality-show de fraca qualidade, sem qualquer respeito por conceitos como a verdade, boa-fé, ciência, decência, honradez, igualdade ou carácter. Alguém que unicamente se preocupa com os seus dólares e com a sua sucessão dinástica.
Certo que Trump cai, que cai sem pingo de honra, lançando acusações ridículas de fraude, roubo e corrupção, instrumentalizando tribunais e com as suas publicações (e dos seus filhos) no Twitter a serem todas censuradas e catalogadas como instigadoras de ódio e de mentirosas. Cai abandonado por parte dos seus ratos mais próximos, agora que sentem o pútrido cheiro do seu fim do mundo, e nós ficamos com a certeza que para metade dos cidadãos daquele país, princípios que deviam ser sagrados e transversais a todos, não valem nada.
Era bom que por cá olhássemos para o que ali se passou e passa e evitássemos, respeitando os eleitores e o que lhes apregoamos, não embarcando em defesas clubísticas do que consideramos inadmissível nos nossos adversários.
Era importante que reconhecêssemos que a aposta séria num sistema educativo, que nos ensina a pensar e a construir uma sociedade mais justa e inclusiva é essencial.
Era importante que entendêssemos que a total inversão das prioridades noticiosas, afogadas até à náusea em esoterismos futebolísticos, pese embora possa dar jeito ao poder de turno, irá contribuir para construir uma sociedade adormecida que a todos afectará no futuro, porque sem essas e outras “vacinas” não seremos imunes a esses fenómenos, nem mesmo nos Açores.