O Togo é um país africano que faz fronteira com o Burkina Faso, o Benim, o Gana e é banhado, a sul, pelo oceano Atlântico. Uma portuguesa, a minha irmã, tem uma colega de trabalho togolesa, nas piscinas estatais de Stuttgart, capital da região de Baden-Wurtemberg, a cidade das conceituadas marcas de automóveis Mercedes-Benz e Porsche.
Na semana passada, a minha irmã relatou-me o episódio de racismo de que foi vítima a amiga e colega de trabalho, devido à cor da sua pele. Um senhor, aquando do check-in, para a entrada nas piscinas, recusou-se a ser atendido por ela e vociferou não compreender como era possível ainda ali trabalhar, quando já tinha apresentado queixa contra ela, há mais de um ano, porque, segundo ele, não reunia as condições necessárias (eventualmente, ser caucasiana…). Gerou-se um conflito verbal, prontamente sanado pela intervenção da minha irmã. O senhor, após entrar, continuou a gritar insultos racistas, expressões que me recuso a transcrever. Outra utilizadora das piscinas, apresentou queixa contra a violência verbal utilizada, foi chamada a polícia, o senhor foi expulso das piscinas, proibida a sua entrada durante 12 meses e será instaurado um processo judicial contra o agressor.
O vírus do racismo é difícil de combater e mais ainda de vencer. Os exemplos sucedem-se, nos quatro cantos do mundo, sendo o caso mais mediático, nos últimos tempos, a morte de George Floyd.
Mais de 150 escritores denunciaram, numa carta aberta publicada no Harpers Magazine[1] e no Le Monde, a crescente intolerância. Personalidades como Chomsky, Gloria Steinem, Margaret Atwood e Martin Amis subscreveram num grito de alerta contra a intolerância e os delitos de opinião. Os subscritores aplaudem os protestos que reclamam justiça social e racial, maior igualdade e inclusão. Mas alertam para o que designam “cancel cultur” (cultura do cancelamento): “um novo conjunto de atitudes morais e compromissos políticos que tendem a debilitar as nossas normas de debate aberto e de tolerância favorecendo uma conformidade ideológica.”
Nos últimos meses estivemos anestesiados, as nossas vidas foram suspensas, deixámos de trabalhar, não visitámos as nossas famílias, não beijámos e abraçámos as pessoas que amamos. Tornámo-nos uma espécie de “cristalizados do confinamento”. Mas, como afirma Lévi, “era preciso resistir, custasse o que custasse, a esse vento de loucura que sopra sobre o mundo.”
Não vivemos tempos normais. O mundo está a viver a primeira crise sanitária global do século XXI. Só na Europa, morreram, até à data, 140 000 cidadãs e cidadãos por causa do vírus. As consequências da pandemia, tanto económicas como sociais, afetam-nos a todos e a todas, sem exceção, ainda que de forma mais ou menos violenta, em função da capacidade de resposta de cada um. Os pobres estão, como indicam os estudos, mais expostos aos vírus. As crises financeiras e sociais são combustíveis para radicalismos e extremismos. Eles estão aí, para quem os quiser ver, com eles se queira importar e contra eles lutar.
Voltando à Alemanha, passe a expressão, segundo os dados do relatório anual da Agência Federal para a Proteção da Constituição, foram atribuídos à extrema-direita mais de 22.300 delitos, incluindo dois assassinatos, cinco tentativas de assassinato e cerca de 800 agressões físicas, o que corresponde a um aumento de 10%. O Ministro do Interior, Horst Seehofer, considera que o extremismo de direita, o antissemitismo e o racismo são “a maior ameaça para a segurança na Alemanha. O número de delitos e o número de extremistas de direita, dispostos a usar a violência, continua a aumentar.” Também o número de militantes da extrema-esquerda continua a aumentar (33.500 em 2018), sendo-lhes atribuídos 6400 delitos, em 2019,incluindo 355 agressões físicas e duas tentativas de assassinato.
“A democracia liberal tem de saber defender-se dos ataques de que é alvo atualmente, que não vêm apenas dos movimentos nacionalistas e populistas da direita e da extrema-direita. Que podem vir também do radicalismo esquerdista, igualmente autoritária e discriminatória sob o manto diáfano das boas intenções.” (Teresa de Sousa, In Público, 12 de julho de 2020).
Resistamos, pois, aos “ventos de loucura”, lutemos contra todos os extremismos e não nos deixemos contagiar por populismos que parecem ganhar adeptos em todo o mundo.
[1] https://harpers.org/a-letter-on-justice-and-open-debate/