Estávamos longe de imaginar viver momentos como os que estamos a passar. Num mundo tecnológico e de fácil mobilidade, não era previsto que um vírus viesse paralisar tudo e mostrar o quanto somos frágeis. Tudo mudou, menos o corpo humano.
Todas as atividades estão a ser afetadas. Quanto ao desporto, área sobre a qual aqui me diz respeito opinar, tem de ser olhado por várias vertentes. O profissional, o semiprofissional, o amador, o da formação e o da imprensa da especialidade.
Assegurar a viabilidade dos calendários é, neste momento, uma prioridade para o futebol profissional. A dependência dos dinheiros dos direitos televisivos a assim obriga. Não o devia ser. Esta época devia, na minha modesta opinião, ser dada por terminada. Dado o panorama atual, é a decisão mais sensata.
Jogar à porta fechada é uma punição, prevista nos regulamentos, e não um instrumento para assegurar receitas televisivas. Colocar em risco a saúde de jogadores, árbitros, dirigentes e de todos os profissionais envolvidos não faz sentido.
As classificações servem para determinar quem vai às provas europeias, quem sobe e quem desce. Não existem os títulos de campeão. A época desportiva não se conclui e, em respeito por todas as vítimas desta pandemia, não devem ser atribuídos os títulos. A história tem de ficar marcada e o espaço em branco vai memorizar e deixar para as gerações futuras uma mensagem e o porquê de não haver campeões em 2019-2020.
Não haverá unanimidade seja qual for o modelo pelo qual se opte. Mas são as próximas épocas que deviam estar a ser pensadas e não tanto esta. Como vai ser a próxima época, como vão ser as competições no futuro próximo. Estas são as reflexões a fazer.
O desporto semiprofissional e o desporto amador têm de ganhar força pela importância que assumem no contexto de proximidade. As aldeias, vilas e cidades têm de olhar para si e não para a TV. Hoje queixamo-nos tanto da falta de convívio, do contacto social, quando antes os tínhamos trocado por écrans, pelo sofá. É no desporto amador que, provavelmente, ainda existe o maior movimento de voluntariado. Antes e acima de qualquer competição, o desporto é uma ação social e comunitária. Não é raro ver homens, mulheres e até mesmo crianças envolvidos em atividades extracampo nas pequenas e médias localidades, principalmente ajudando a preservar e manter a estrutura dos clubes e dos campos de jogo. E isso só acontece quando a comunidade local trabalha em prol de si mesma. Quando se preocupa com o seu bem-estar e desenvolvimento.
É que o desporto também é uma atividade económica. O emprego no desporto teve em Portugal, entre 2011 e 2018, uma taxa de crescimento de 57,8%, passando de 23 883 para 37 680 postos de trabalho, segundo resultados apurados a partir do projeto European Sector Skills Alliance for Sport and Physical Activity (ESSA-Sport). O desporto de formação não é resultadista. É avaliado pelo processo. Quem tem trabalho de qualidade realizado está preparado para o retomar assim que haja condições para o fazer.
A imprensa da especialidade tem vindo a perder credibilidade ao longo dos últimos anos. A falta de isenção e rigor levaram a uma perda de leitores. Os grandes clubes fecharam-se, mal, na sua própria comunicação e os principais jornais passaram só a ser amplificadores do que esses clubes publicam nos seus canais de comunicação oficiais. Começaram a dar protagonismo a pessoas, só por serem conhecidas, para destilar ódios clubistas. De desporto nada percebem. O estatuto editorial não é respeitado. Quem não se respeita…
Aproveitemos, pois, esta pausa que foi imposta nas nossas vidas para refletir sobre a importância do desporto. Do desporto profissional, sem dúvida, e do que podemos fazer desde já para melhor preparar o seu futuro, mas também do desporto semiprofissional, amador e de formação, e da forma como os podemos promover e valorizar em prol da comunidade no seu todo.