AQUILINO – “CINCO RÉIS DE GENTE”

8 – A TIA ANA – UMA ESTRANHA VARINHA DE CONDÃO     Esta tia não sabia ledas histórias como a tia Custódia e a cantar era uma cana rachada. Para me compensar desta inferioridade, encomendava aos rapazes habilidosos da aldeia, arados, grades, engacinhos, carros miniaturais, com leito de corcódoa e rodas de castanhas, que […]

  • 9:40 | Quinta-feira, 31 de Março de 2016
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8 – A TIA ANA – UMA ESTRANHA VARINHA DE CONDÃO

 

 


Esta tia não sabia ledas histórias como a tia Custódia e a cantar era uma cana rachada.

Para me compensar desta inferioridade, encomendava aos rapazes habilidosos da aldeia, arados, grades, engacinhos, carros miniaturais, com leito de corcódoa e rodas de castanhas, que me trazia com a unção da rainha do Sabá, e eu estimava mais que os civilizadissimos brinquedos de Nuremberga.

                                                                               Cinco Réis de gente, p. 31-32

 

Ana e Custódia moravam ambas numa casinha abonada, no Eido, com balcão e uma quintã. Eram ambas solteiras. Tinham de seu uma vinha com árvores de fruto nas beiras, terras de centeio bastante para sua mantença, uma horta mimosa e um linhar para a sementeira do linho.

Ana ajudava a irmã Custódia sempre que era preciso montar urdidura nova no tear, enchia as canelas no caneleiro e preparava, a partir das roupas velhas, tirinhas de tecido que depois cozia para as mantas de farrapos. E era ela quem fiava pelo Inverno fora as estrigas de linho.

Ana não sabia cantar como a sua irmã, não sabia contar tantas histórias nem encarreirava as lengas-lengas direitinho.

Aquilino gostava de sair à tarde com a tia.

A tia conduzia-o por mágicos caminhos para lhe mostrar a “cova da moira” num pinheiral distante, as “letras” que os mouros escreveram numa pedra do caminho e que ninguém até à data conseguira decifrar, o misterioso penedo onde se ouvia, se nele se encostasse o ouvido, os sinos da igreja a tocar.

Aquilino também gostava de ir com ela deitar miolinhos de pão aos peixes do ribeiro.

Às vezes a tia Ana levava-lhe um brinquedo novo que mandava fazer aos rapazes mais velhos em troca de uma mão-cheia de nozes ou de uma boina  de cerejas. E Aquilino entretinha-se horas inteiras com os arados, as grades, os carros de corcódoa e os ancinhos que a tia Ana lhe levava.

 

Foto: José Alfredo

 

 

 

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